segunda-feira, 18 de abril de 2011

Novo Plano Nacional transfere para escolas privadas obrigação do Estado em garantir o direito à educação

Do site do dep. fed.  Ivan Valente

Passados dez anos do atual Plano Nacional de Educação, o balanço não é muito positivo. Apenas um terço das metas decenais foi cumprido e o PNE não serviu de base para as políticas governamentais das últimas gestões. A avaliação, compartilhada por especialistas, docentes e estudantes, foi um dos temas debatidos no seminário “O PNE e os desafios da luta em defesa da escola pública”, promovido pelo Mandato do Deputado Federal Ivan Valente no último sábado (09/04), em São Paulo.

Luiz Araújo, mestre em Educação, assessor da bancada do PSOL no Senado e ex-presidente do Inep/MEC (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), lembrou que apesar de o Brasil ter incluído 97,6% das crianças de 6 a 14 anos e 74,8% das crianças de 4 e 5 anos na escola, apenas 18,1% das crianças de 0 a 3 anos estão matriculadas. Os pobres são os menos incluídos e na maior parte em escolas comunitárias. Da mesma forma, apesar de 85,2% dos jovens de 15 a 17 anos estarem na escola, somente metade está no ensino médio. E o Brasil ainda tem mais de 14 milhões de analfabetos maiores que 15 anos de idade. “No ritmo em que andamos, segundo o IPEA vamos levar 20 anos para erradicar o analfabetismo no país”, afirmou.

Em relação ao ensino superior, os números são ainda piores. Apenas 13,6% dos jovens estão matriculados. Este percentual é de apenas 7,7% entre os negros e a maioria das vagas estão concentradas nas regiões sul e sudeste e nas escolas particulares.

“O MEC tem que apresentar a avaliação do Plano Nacional de Educação anterior, pelo qual foi co-responsável, e dizer por que as metas não foram cumpridas”, afirmou Lisete Arelaro, Diretora da Faculdade de Educação da USP.

Insuficiência
Para enfrentar este quadro, os especialistas do setor presentes no debate acreditam que as metas propostas pelo governo federal para os próximos dez anos são insuficientes, além de deixarem nas mãos do mercado a maior parte da expansão do acesso à educação. Composta de 12 artigos, 20 metas e 170 estratégias, a proposta atual apresenta uma clara intenção de repassar a tarefa do crescimento para a iniciativa privada.
Quando o Plano discute o ensino profissional, por exemplo, uma demanda reprimida da juventude, não há percentuais de expansão da rede pública. O mesmo acontece com o ensino superior.

“A lógica predominante hoje na Educação é a da punição/responsabilização dos professores, que ganham ou perdem bônus de acordo com a produtividade; a meritocracia; e a privatização. Se a escola não cumpre metas, é fechada ou sua gestão é transferida para a iniciativa privada”, avalia Luiz Carlos de Freitas, professor titular da Faculdade de Educação da Unicamp. “Se perdermos esta batalha, grandes cadeias nacionais e internacionais vão desembarcar no Brasil e administrar a educação básica via contratos de gestão. Com a entrada do Brasil no BRIC [bloco dos países emergentes], o país passa a ser objetivo de investimento e muda o interesse do mercado sobre o aparato da educação no Brasil”, acrescentou.

Para Freitas, estamos diante de uma agressão brutal ao ensino público, pelo que o projeto do novo PNE diz e também pelo que não diz, que permitirá mudanças significativas na educação pública no âmbito dos municípios e estados.

“Nos surpreendeu também a pouco exigência em relação ao ensino privado superior. Não há nenhum artigo sobre contrapartidas. Isso mostra com quem estamos dialogando. A mercantilização está entre nós; já uma naturalização do processo da educação como mercadoria. Há, portanto, um trabalho de desmistificação e sensibilização que temos que abraçar”, acrescentou Lisete Arelaro.

Financiamento
Tão importante quanto o debate sobre a defesa do ensino público é a discussão sobre de onde sairá o dinheiro. O PNE proposto avança neste sentido em relação ao anterior, mas apresenta como teto de gasto 7% do PIB. “O ministro repetiu o eterno mantra da área econômica de sucessivos governos: para elevar os gastos sociais é preciso aumentar tributos. Por isso propôs metas tímidas para o PNE”, disse Luiz Araújo. “Mas, ao contrário do que afirma o governo federal, os atuais recursos educacionais não foram suficientes para provocar uma melhoria sensível na qualidade do aprendizado. O investimento público em educação representou em 2009 apenas 5% do Produto Interno Bruto. Vale lembrar que a sociedade civil defendia 10%, o Congresso aprovou 7% e o governo vetou este percentual”, criticou Luiz Araújo.
“Foram criadas 35 novas universidades, mas estamos estacionados nos gastos com o ensino superior. Isso não significa necessidade de novos investimentos?”, questionou Lisete.

Na opinião do deputado federal Ivan Valente, não há como superar o passivo educacional brasileiro sem investimentos massivos no setor. “O PNE foi, na verdade, um “não-plano”. O veto de Fernando Henrique, mantido por Lula, aos dispositivos que permitiam aumentar as verbas para a educação inviabilizaram o plano. Na verdade, a educação tem sido tratada como um grande tema de campanhas eleitorais e, quando chega na hora do investimento, é secundarizada diante da opção econômica dos governos. Vale a lógica do ajuste fiscal para favorecer o capital financeiro”, criticou.

O deputado, que integra a Comissão Especial da Câmara que vai debater o novo PNE, apresentou ao Congresso um projeto de plebiscito para ouvir a população brasileira sobre quanto do PIB deve ser gasto com a educação.

Mobilização
Para o conjunto dos participantes do debate, ficou claro que, sem mobilização de baixo pra cima, será muito difícil resistir ao modelo de expansão defendido pelo governo e às tentativas de liberalização propostas pelo setor privado. “O principal adversário é o governo federal, porque é o principal protagonista do debate e porque suas propostas privatistas possuem espaço na mídia e na base parlamentar”, lembra Araújo.
Outra dificuldade é que, ao contrário do final dos anos 90, quando foi discutido o I Plano Nacional de Educação, hoje o conjunto das organizações da educação não está do mesmo lado. “Há várias entidades já defendem as teses presentes no PNE. As universidades não pautaram a questão e a esquerda tem posições divergentes”, analisa Lisete.

“Não temos que acirrar as divergências entre nós, mas é preciso dar nomes aos bois. O campo de lá está organizado num tripé ideológico entre partidos políticos, indústrias e mídia. É um bloco muito difícil de ser enfrentado. O governo Dilma não vai segurar isso porque está maravilhado com essa demanda de mercado de países emergentes. Mas este processo certamente abrirá contradições”, acredita Luiz Carlos de Freitas.
 
“Sabemos que a correlação de forças é desfavorável, mas deve haver um processo de resistência e de desgaste. Esse processo vai se dar na luta e no constrangimento de entidades que já comandaram a defesa da escola pública e hoje estão amarradas com a política do governo. A sensação da população é que a escola está muito ruim. A insatisfação é grande e é possível mobilizar. Existe um espaço à esquerda”, afirmou Ivan Valente.

O Mandato do Deputado Federal Ivan Valente está finalizando a elaboração de um conjunto de mais de 100 emendas ao PNE para apresentar na Comissão Especial, e coletando nas ruas assinaturas em favor do plebiscito dos 10% do PIB para a educação. Serão elaboradas ainda uma publicação e um DVD com o conteúdo deste debate.

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