sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Se professora for assassinada, a responsabilidade será do Governo Jatene


Ameaçada de morte, Laísa Santos ainda aguarda proteção policial

Citada no último relatório da Anistia Internacional sobre a situação dos defensores de direitos humanos na América Latina, a professora Laísa Santos Sampaio, ameaçada de morte por defender a Floresta Amazônica, ainda não conseguiu proteção do governo.  Enquanto aguarda em Nova Ipixuna (PA), teme ter o mesmo destino de sua irmã e de seu cunhado, assassinados por causa de disputas de terra na região.

Os extrativistas Maria do Espírito Santo e José Cláudio Ribeiro foram mortos no ano passado, nessa mesma cidade. Laísa tem seu caso reavaliado pelo Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, do governo federal – em uma análise preliminar, a proteção foi negada. Além da menção no relatório da Anistia Internacional, corre na internet uma petição pública para que ela receba proteção imediata. Dos cinco suspeitos da morte do casal, dois continuam soltos.

Em fevereiro, a professora recebeu em Nova York um prêmio póstumo oferecido pela ONU a seus familiares, que denunciavam o uso irregular de terra e o desmatamento na região do assentamento agroextrativista Praia Alta Piranheira, o primeiro do tipo no Pará. Desde então, mesmo ameaçada, Laísa dá aulas na escola local e mantém o Grupo de Trabalhadoras Artesanais Extrativistas, que produz fitocosméticos e fitoterápicos com óleo da andiroba.
A entrevista é publicada por Amazonia.org.br, 03-01-2013.
Eis a entrevista.

Qual a origem das disputas?


Isso se deve ao processo desordenado de ocupação de terras na Amazônia. Em 1997, foi designada uma área de 22 mil hectares para o primeiro projeto agroextrativista do Pará. Nessa área, que pertencia a grandes fazendeiros de Marabá, há predominância de culturas como a castanha e o cupuaçu, além do babaçu e do açaí, em menor escala. Colocaram então o Zé Cláudio, meu cunhado, como primeiro presidente da Associação dos Pequenos Produtores do Projeto de Assentamento Praia Alta Piranheira (Apaep). Desde o início houve tensão, pois a Maria, minha irmã, e o Zé Cláudio bateram de frente e os próprios fazendeiros os procuraram com pistoleiros. Foram três linhas de perseguição. Uma foi por causa desses conflitos por lotes de terra. Depois, pela questão madeireira, pois em 2004 começou a se intensificar a entrada dos madeireiros no assentamento e, logo em seguida, foi a vez dos carvoeiros.

Por que começaram a invadir?


Em um primeiro momento, viram que a Maria e o Zé Cláudio tinham coragem ímpar e respeitaram. Depois de um tempo foram acabando as espécies madeireiras de valor nas áreas próximas. Então, começaram a invadir o assentamento para tirar as castanheiras, que são protegidas por lei. Para isso, entravam armados. O Zé Cláudio e a Maria paravam o caminhão e discutiam. Tentavam interditar de qualquer forma, fazendo registros fotográficos. Depois, vieram os carvoeiros, que derrubam todas as espécies de árvore e deixam a área desertificada.

Falta fiscalização ali?

Há muita floresta na região, é propícia para práticas ilegais. Mas há descaso do governo, pois em um projeto extrativista tem de haver fiscalização intensiva. O madeireiro entra e sai porque não há fiscalização permanente. Quando apareciam, os fiscais até diziam que só estavam ali porque havia sido feita uma denúncia.

Quando começaram as ameaças?

A primeira de que me lembro foi em 2001, quando chegou à casa deles uma caminhonete com um fazendeiro e três pistoleiros. Com um papel na mão, tentaram despistar o Zé Cláudio, mas ele não tirou o olho deles. Na saída, ainda disseram: “Não foi desta vez”.

Os dois pediram ajuda às autoridades?

Tenho queixas deles protocoladas no Ibama e no Incra. Eles pediram auxílio nos níveis municipal, regional, estadual e até federal. Procuraram o Ministério Público, que veio algumas vezes, mas voltava depois de seis meses e não conseguia avançar na investigação.

Quando foram mortos?

Foram assassinados juntos no dia 24 de maio de 2011, aqui mesmo no assentamento, a 4 quilômetros da casa deles. Estavam indo em direção à cidade numa moto e tiveram de parar em uma ponte velha. Era um ponto estratégico, onde dois pistoleiros estavam esperando. A investigação da Polícia Civil apontou como principal mandante um homem chamado Zé Rodrigues, que também está preso. Mas a Polícia Federal chegou a cinco nomes, pelas intercepções que foram feitas. Esses outros dois não estão presos.

Qual era a disputa em questão?
Esse Zé Rodrigues é um pequeno fazendeiro que comprou lotes de forma irregular no assentamento, em uma área que já era ocupada por três famílias havia mais de oito meses. Ele se achou no direito de expulsar, colocou fogo no acampamento. O Zé Cláudio e a Maria fizeram a denúncia na Pastoral da Terra e na polícia. Quando o Zé Rodrigues soube, falou que ia perder os lotes, mas que aquilo custaria muito caro para o casal. Foi a partir daí que souberam que iriam morrer. A Maria dizia que ele era perigoso e tinha um irmão pistoleiro, que acabou sendo um dos assassinos.

Houve outras mortes relacionadas?

Aqui na nossa área foram apenas os dois. Ele tinha 53 e ela, 52. Estavam juntos havia quase 26 anos. Mas em assentamentos vizinhos foram várias pessoas (a Anistia Internacional estima que sejam em torno de 20). O caso de mais destaque foi o da irmã Dorothy Stang (morta em 2005), em Anapu. Em Morada Nova, mataram um dos líderes, com a mulher e o filho. Então, são muitos casos que vêm ocorrendo pela questão da terra.

Você teve de fugir?

Depois do assassinato, passei sete meses em Marabá, pois começamos a receber recados. Mataram meu cachorro a tiros, alvejaram a porta da minha casa, disseram que, se continuasse falando, ia acontecer a mesma coisa. O último episódio foi em agosto. Estava chegando em casa quando uma moto parou com duas pessoas de capacete. Estavam longe e avançaram em minha direção. Corri. Quando gritei, recuaram e saíram do meu rumo. Acho que pensaram que havia alguém perto.

O que mudou em sua rotina?

Minha liberdade. Andava de moto sozinha até a cidade, hoje não tenho essa coragem. Para esperar um carro na estrada, meu marido tem de me acompanhar. Se vou de moto para a cidade, peço à viatura da polícia para me acompanhar na volta. Não posso participar de confraternizações da comunidade. Na ultima eleição, fui à festa de um vereador eleito e lá tinha parentes de uma pessoa que sei que quer tirar minha vida. Mas não tem jeito, é uma comunidade pequena. Sou professora de um sobrinho dos que são acusados de serem os assassinos de Maria e Zé Cláudio.

Que tipo de trabalho você faz?

Sempre trabalhei na escola com a questão do extrativismo como ferramenta do desenvolvimento sustentável. Enquanto a Maria e o Zé Cláudio faziam o enfrentamento contra a atividade ilegal, eu trabalho na sensibilização por meio da educação. É um projeto de arte e educação para o desenvolvimento sustentável. Mas fui recebida com abaixo-assinado contra o meu retorno. Eram 13 no grupo de mulheres extrativistas e passamos a ser só 5. Algumas delas admitiram que não tinham coragem, ficavam com medo porque tinham ouvido falar que iriam me matar.

Como acontecem essas ameaças?

Recebo recado de pessoas que não andam com meus inimigos, mas que dizem que ouviram ameaças. A Maria e o Zé Cláudio recebiam muito esse tipo de recado até a véspera de serem mortos.

Quem são seus inimigos?

Agora conquistamos antipatia de parte dos donos de pequenos lotes. Depois do assassinato, alguns foram multados pelo Ibama, que veio aqui há uns meses e puniu os que faziam carvão e continuavam a extrair madeira ilegal. Teve um que disse: ‘Vou pagar a multa, mas vai custar caro para essa mulher’. Algo parecido com o que diziam para a Maria.

A sra. Pretende deixar o assentamento?

Pensar em sair daqui é ultima hipótese. Sempre penso em permanecer, que isso pode mudar. Já me pediram provas dessas ameaças. Eu digo: a prova é o óbito. A Maria e o Zé Cláudio viveram as mesmas coisas. O Zé Cláudio, no TEDx Amazônia (conferência global), disse que vivia com uma bala na cabeça, em um vídeo que se tornou conhecido internacionalmente. Mas não houve pesquisa para ver se o que ele falava era verdade.

Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/516737-ameacada-de-morte-laisa-santos-ainda-aguarda-protecao-policial#.UOcG5Ux1tOQ.twitter

McDonald's e a moderna escravidão

 As armadilhas do McDonald's

Por Michelle Amaral, no jornal Brasil de Fato:

Atraídos pela chance do primeiro emprego, milhares de jovens brasileiros procuram a rede de restaurantes fast food McDonald´s para trabalhar. Eles buscam a oportunidade de iniciar a vida profissional e conquistar independência financeira. No entanto, pela pouca maturidade e falta de experiência, esses jovens se veem submetidos a condições irregulares de trabalho e têm usurpados seus direitos básicos.
“O McDonald´s tem essa imagem do primeiro emprego, [na contratação] eles passam uma coisa totalmente diferente do que é”, afirma Tatiana, que ingressou na rede de fast food com 16 anos e lá viveu uma das piores experiências de sua vida, que lhe traz consequências até hoje.

Aos 18 anos, Tatiana escorregou no refrigerante que havia escorrido de uma lixeira quebrada, caiu e sofreu uma séria lesão no joelho. Com fortes dores, a jovem foi levada para o gerente da loja. “Ele falou: ‘passa um Gelol e põe uma faixinha que sara’”, relata. Era final de ano, o restaurante estava lotado e Tatiana foi orientada a continuar trabalhando até o final do expediente. Após dois dias, sem conseguir andar, Tatiana procurou o médico, que diagnosticou o rompimento da rótula de seu joelho direito e indicou a necessidade de uma cirurgia.

Segundo ela, ao procurar o McDonald´s para informar as consequências da queda, nada foi feito pela empresa que, inclusive, se negou a emitir um Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT). “Eu fui ao INSS e perguntei como podia fazer esse CAT. Me deram o papel e mandaram eu ir até o McDonald´s”, conta a jovem, que afirma ter sido orientada pelo gerente a não informar a data correta do acidente para que não resultasse em multa para a loja. Ela ainda denuncia que a gerência sabia do defeito na lixeira, mas não a consertou para evitar gastos, resultando em seu acidente.

De lá para cá, a trabalhadora viveu sob intenso tratamento médico e teve que procurar reabilitação profissional por meios próprios, já que não podia exercer as mesmas funções e o McDonald´s se recusou a adaptá-la em outra área da empresa. Ela se formou em Direito e realizou estágio em um escritório de advocacia. Com isso, após 11 anos do acidente, Tatiana conseguiu a carta que a declara ser pessoa portadora de deficiência física e dá o reconhecimento de sua reabilitação pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

Hoje, aos 34 anos, Tatiana anda com o auxílio de uma muleta. Já passou por três cirurgias e necessita, ainda, realizar mais uma. No entanto, em março deste ano, ao tentar passar por uma consulta médica para agendar o procedimento, a trabalhadora foi informada do cancelamento de seu plano de saúde. O motivo foi a conclusão em janeiro da rescisão indireta do McDonald´s, solicitada pela trabalhadora em 2009. “O McDonald´s deveria ter comunicado ela [sobre o cancelamento da assistência médica], porque a lei diz isso, mas não comunicou, simplesmente cancelou”, protesta Patrícia Fratelli, advogada da trabalhadora.

De acordo com a Lei nº 9.656 de 1998, regulamentada pela Resolução Normativa nº 279 da Agência Nacional de Saúde (ANS), no caso de rescisão do vínculo empregatício é assegurado ao trabalhador “o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral”. “Eu tinha condição de pagar o meu convênio, o McDonald´s tinha que ter me dado essa opção, porque agora perdi a carência e nenhum convênio vai me aceitar”, desabafa Tatiana, que há quase 16 anos enfrenta uma batalha judicial contra o McDonald´s para ter seu dano reparado. 

Armadilha
O caso de Tatiana não é isolado. Tramitam na Justiça do Trabalho na cidade de São Paulo e região metropolitana 1.790 ações contra o McDonald´s e a Arcos Dourados Comércio de Alimentos Ltda., franqueadora master da multinacional no Brasil e na América Latina. Somente na capital paulista são 1.133 demandas judiciais ativas por conta das irregularidades trabalhistas e o tratamento inadequado dado pela empresa aos seus funcionários, conforme levantamento feito junto ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região.

Entre as falhas cometidas pelo McDonald´s estão o pagamento de remunerações abaixo do salário mínimo, utilização de jornada de trabalho ilegal, falta de comunicação dos acidentes de trabalho, fornecimento de alimentação inadequada, não concessão de intervalo intrajornada, ausência de condições mínimas de conforto para os trabalhadores, prolongamento da jornada de trabalho além do permitido por lei, assédio moral e sexual. Além disso, existem denúncias de jovens que trabalharam sem serem remunerados (leia matéria, clique aqui).

No Brasil, o McDonald´s emprega hoje 48 mil funcionários, de acordo com informações publicadas em seu site. Destes, 67% têm menos de 21 anos e 89% tiveram na rede de fast food a primeira oportunidade de emprego formal. Questionado pela reportagem sobre os processos movidos contra ele, o McDonald´s disse que “não comenta processos sub judice”.

Para Rodrigo Rodrigues, advogado do Sindicato dos Empregados em Hospedagem e Gastronomia de São Paulo e Região (Sinthoresp), a oferta do primeiro emprego a esses jovens é pensada pelo McDonald´s a fim criar nesses trabalhadores o sentimento de submissão incondicional, em que o contratado acata tudo o que lhe é imposto, pela gratidão da oportunidade de trabalho. “A pessoa fica com receio de se indispor contra o tratamento que é dado na empresa. Isso é sutilmente pensado para que se chegue a essas finalidades”, alega.

A mesma avaliação é feita pelo procurador Rafael Dias Marques, coordenador nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho (MPT). Segundo ele, a necessidade do primeiro emprego e a vontade de começar a vida profissional são vistas por alguns empregadores como uma possibilidade de fraudar direitos que são garantidos a esses trabalhadores por lei. “Muitas empresas preferem contratar os mais jovens para evitar problemas trabalhistas, para torná-los uma massa de manobra mais fácil para executar [o trabalho] sem direitos trabalhistas, sem qualquer questionamento ou um questionamento mais brando”, afirma.

O procurador explica, ainda, que a pouca maturidade torna a contratação desses jovens vantajosa para essas empresas. “São pessoas que, por ainda serem jovens, não tem o senso crítico do questionamento e de resistir a determinadas situações de lesões de direitos”, analisa.

Garantia de direitos
O advogado do Sinthoresp lembra que o jovem tem que ser visto como um ser em transformação, que necessita de cuidados que lhe assegurem uma boa formação para a vida. “O trabalho é uma condição necessária, mas deve ser implementado aos poucos, não pode ser do jeito que está, coloca o jovem lá e vamos ver o que vai dar”, pondera Rodrigues. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) permite a contratação de adolescentes a partir de 14 anos, na condição de aprendiz, e de 16 anos para o trabalho normal. No entanto, o estatuto estabelece que a eles deve ser observado “o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”.

Desta forma, Marques ressalta que a atividade profissional não pode ser prejudicial ao desenvolvimento físico e social destes adolescentes e jovens, seguindo o que estabelece o Decreto nº 6.481/2008. “Eles são pessoas peculiares em desenvolvimento, em fase de formação, por isso que o trabalho nessa fase da vida tem que ser diferenciado”, analisa.

O procurador alerta que, se não observados os cuidados com esses jovens, o trabalho pode lhes causar danos irreversíveis para a vida adulta. “O risco de lesão à saúde por uma situação do trabalho é muito mais evidente nessa parte da população, porque ainda que está em formação biológica”, observa. Segundo ele, “uma doença do trabalho nessa fase da vida é mais suscetível a ter continuidade, inclusive de levar ao quadro da invalidez”.

Foi o que aconteceu com Tatiana. Com o acidente ocasionado por uma negligência da empresa, teve sua vida completamente mudada. “ Tive que parar a minha vida. Fiquei um tempo sem estudar. Queria fazer enfermagem e o médico falou que eu nunca poderia ser enfermeira, porque não podia ficar em pé”, conta.



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Fonte: Blog do Miro.