sexta-feira, 19 de abril de 2013

Tapajós: a vida pede passagem, mas governo Dilma não quer deixar

Vídeo da Pública - Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo mostra a insanidade e a sede de rapina do governo Dilma (PT/PMDB) e empreiteiras que movem o criminosos projeto de destruição dos rios e vida da Amazônia. É o que já ocorre na região do município paraense de Altamira. É o que acontecerá no místico rio Tapajós. Mas só se você e eu ficarmos olhando tudo e não fizermos nada.
Diga não às barragens na Amazônia!
Águas para a vida e não para a morte!
Vamos à luta!

Dia do Índio: MPF vai à Justiça em defesa de terras indígenas das regiões de Belo Monte e nordeste do Pará


Protesto do Movimento Xingu Vivo para Sempre em Altamira/PA. Fonte foto: Telma Monteiro.

Em todo o país data é lembrada com o ajuizamento, pelo MPF, de 14 ações civis públicas visando garantir terras que povos indígenas tradicionalmente ocupam
19/04/2013

O Ministério Público Federal (MPF) no Pará entrou na Justiça neste 19 de abril, Dia do Índio, com ações para garantir o direito à terra a povos indígenas da região do Médio Xingu, impactados pela construção da hidrelétrica de Belo Monte, e ao povo Tembé, no nordeste do Estado. A iniciativa faz parte de uma mobilização nacional que o MPF promove desde o início do mês. 
Em todo o país o MPF está ajuizando, nesta sexta-feira, um total de 14 ações civis públicas visando garantir terras que povos indígenas tradicionalmente ocupam. Além disso, estão sendo expedidas recomendações para instituições públicas e empresas privadas (veja detalhes abaixo). 
No caso das Terras Indígenas (TIs) dos povos do Médio Xingu, a ação judicial trata do descumprimento das medidas de proteção das TIs afetadas pela hidrelétrica de Belo Monte. As medidas deveriam ter sido providenciadas pelos responsáveis pelo empreendimento, mas, como foram descumpridas, "submetem hoje os povos indígenas do Médio Xingu à situação limítrofe de um etnocídio", denuncia o MPF. 
Assinada pelos procuradores da República Thaís Santi Cardoso da Silva, Meliza Alves Barbosa, Ubiratan Cazetta e Felício Pontes Jr, a ação pede à Justiça, entre outros requerimentos, a suspensão da licença de instalação da hidrelétrica até que sejam executadas as medidas indispensáveis à proteção das TIs, como a construção de 21 unidades de proteção territorial e a contratação e capacitação de agentes para atuar nessas unidades. 
A ação relacionada aos direitos dos Tembé foi ajuizada em favor da demarcação das TIs de Jeju e Areal, localizadas em Santa Maria do Pará, no nordeste do Estado. O MPF pede à Justiça que obrigue a União e a Fundação Nacional do Índio (Funai) a realizar a demarcação das terras e a desintrusão de eventuais posseiros que se encontrem nas áreas. O procurador da República Felício Pontes Jr. solicitou, ainda, que União e Funai sejam condenadas a pagar indenização de R$ 19 milhões aos indígenas por danos morais coletivos.
Ainda em relação à proteção de TIs, no Pará o MPF comemora esta semana vitória obtida no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). A partir de recurso dos procuradores da República Fernando Antônio Alves de Oliveira Jr., Felipe Bogado e Luiz Antonio Miranda Amorim Silva, o TRF-1 suspendeu a Operação Tapajós, operação militar e policial promovida a mando do governo federal na região da TI Munduruku, onde está planejada a usina hidrelétrica São Luís do Tapajós, no oeste do Estado. A área, que já foi oficialmente reconhecida como indígena, aguarda demarcação.
No Pará o MPF também está levando esses temas para as salas de aula. Os procuradores da República Felipe Bogado e Melina Alves Tostes divulgaram para as secretarias de educação de todos os municípios das regiões de Santarém e Marabá a cartilha sobre direitos indígenas produzida pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.
No país - Desde o início do mês, o MPF vem realizando mobilização nacional (detalhesaqui) em defesa dos territórios indígenas, trabalho que culmina neste 19 de abril, quando é comemorado o Dia do Índio. Hoje também está sendo realizada audiência pública no Auditório Juscelino Kubitschek da Procuradoria Geral da República, em Brasília (detalhes aqui). 
No evento, está prevista a participação de representantes de aproximadamente 70 povos indígenas, além de representantes do Ministério da Justiça, da Funai, da Câmara dos Deputados, da Advocacia-Geral da União, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, da Secretaria Nacional da Articulação Social da Presidência da República e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). 
Pelo MPF, participarão a vice-procuradora-geral da República e coordenadora da 6ª Câmara, Deborah Duprat, os subprocuradores-gerais da República Luciano Mariz Maia e Maria Elaine Menezes de Farias (ambos membros da 6ª Câmara) e as procuradoras da República Márcia Brandão Zollinger, Natália Lourenço Soares e Walquiria Imamura Picoli. 
Contexto - Embora a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 231, garanta aos povos indígenas a posse das terras tradicionalmente ocupadas por eles, ainda há muito o que se fazer para que a legislação seja cumprida.
A ideia, muitas vezes difundida por aqueles contrários aos direitos indígenas, de que 'há muita terra para pouco índio' decorre justamente do desconhecimento das distintas lógicas espaciais dos povos indígenas, principalmente daqueles que vivem em áreas da floresta amazônica. É fruto também da ocultação da realidade fundiária da maior parte dos povos indígenas das demais regiões brasileiras, onde as dimensões das terras que lhes foram reconhecidas são, em não poucos casos, insuficientes para sua reprodução física e cultural. 
Também é muito importante sabermos que a demora do Estado para regularizar terras indígenas deixa tal parte da população vulnerável. Segundo o Conselho Indigenista Missionário, as terras que continuam sem regularização final, mesmo as registradas e declaradas, são mais expostas a invasões, ocupações, desmatamento e exploração ilegal de recursos naturais.

Confira detalhes sobre as ações civis públicas ajuizadas e as recomendações expedidas neste Dia do Índio em outros Estados: 
Amapá - Em ação civil pública, o MPF no Amapá pede, em caráter de urgência, a anulação e o cancelamento de qualquer cadastro ou autorização – mesmo que de mero estudo minerário – para futura exploração em terras indígenas. O MPF também quer que seja mantida a proibição de lavras garimpeira e minerária nessas áreas. Atualmente, mais de 500 requerimentos para pesquisa e exploração de minério em terras indígenas do Amapá tramitam no Departamento Nacional de Produção Mineral. Com a decisão favorável, o MPF espera que sejam anulados títulos minerários nominados e inominados emitidos pela autarquia para essas áreas. Dessa forma, a instituição pretende evitar a lesão e assegurar os direitos dos índios.
Amazonas - o MPF ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal para que a União e a Fundação Nacional do Índio  (Funai) providenciem imediatamente a realização de estudos de revisão dos limites da terra indígena Waimiri Atroari. Em 2008, o MPF já havia expedido recomendação solicitando à Funai e à União os estudos de revisão por conta de parte da área habitada tradicionalmente pelos indígenas ter sido ocupada pelas instalações da usina hidrelétrica de Balbina. 
“Após o decurso de mais de quatro anos desde que a Funai manifestou interesse em realizar os estudos recomendados, a terra indígena Waimiri Atroari e, consequentemente, o povo que a habita, vem suportando os encargos das mais variadas e gradativas pressões, inerentes ao desenvolvimento econômico que incide sobre a região amazônica”, declarou o procurador da República Julio José Araujo Junior.
Em outras duas ações civis públicas, o MPF aciona a Justiça para que a Funai conclua os processos demarcatórios das Terras Indígenas Ponciano e Murutinga, do povo indígena Mura, localizadas no município de Autazes. Desde o ano passado, os estudos de identificação das áreas estão finalizados, mas a Funai não encaminhou os processos ao Ministério da Justiça.
O MPF recomendou ainda que o município de Autazes suspenda a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) no interior da Terra Indígena Pantaleão, cujo processo demarcatório está em andamento, na fase de análise do relatório de fundamentação antropológica pela Funai.
Com o objetivo de garantir a atenção de saúde a comunidades indígenas ainda não atendidas pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Manaus, o MPF recomendou ao Dsei e à Coordenação Regional da Funai na cidade que analisem a questão, identificando as comunidades ainda não atendidas, e elaborem plano de atendimento às regiões identificadas, no prazo máximo de três meses.
Bahia - o MPF ajuizou três ações contra a União e a Funai, buscando a conclusão de processos de demarcação de terras e a relocação de comunidades não indígenas que vivem em territórios já demarcados. As ações são propostas pelo procurador da República Leandro Mitidieri, que atua no município de Paulo Afonso, e favorecem as comunidades Tumbalalá (Abaré), Truká-Tupã (Paulo Afonso), Xukuru-Kariri de Quixaba (Glória), Pankararé do Brejo do Burgo (Glória) e Kaimbé Massacará (Euclides da Cunha) e Atikum (Rodelas).
Para ele, os problemas relacionados às terras indígenas devem ter solução prioritária, uma vez que, sem território demarcado, os indígenas têm enorme dificuldade de acesso a serviços públicos, principalmente à saúde e à educação. “As comunidades indígenas do nordeste sofreram o primeiro impacto da colonização e são algumas das mais desagregadas do Brasil. Os problemas que diversos índios sofrem agora no país, com a criação de hidrelétricas que inundam suas terras, foram vivenciados pelos índios do norte da Bahia na década de 1980, e o processo de relocação destas comunidades nunca foi concluído”, explica Mitidieri.
Maranhão - No Maranhão, os procuradores da República Natália Lourenço Soares e Douglas Guilherme Fernandes, da Procuradoria da República no Município de Imperatriz (PRM/Imperatriz), expediram recomendação para que seja finalizado o processo de desintrusão da terra indígena Krikati e propuseram ação civil pública contra a Eletronorte.
Neste último caso, pedem para que o componente indígena seja levado em consideração na renovação do licenciamento ambiental de torres que passam em território indígena e e também a execução de liminar concedida pela Justiça Federal que determina a inclusão do componente indígena nas medidas de segurança do uso da MA-280. A estrada corta 32 quilômetros de terra indígena, colocando em risco a segurança da comunidade. 
Para a procuradora da República Natália Lourenço Soares, a movimentação em prol do Dia do Índio significa mais do que demarcar terras, buscando a segurança desses povos. “Essas ações são importantes para garantir aos indígenas o usufruto exclusivo de suas terras. Mas a questão vai além, porque proteger os territórios indígenas também traz reflexos para o meio ambiente e preservação dessas áreas, além de evitar conflitos entre os índios e pessoas estranhas que ocupam o território deles”, afirma.
Mato Grosso – o MPF propôs ação civil pública para que a Funai adote as medidas administrativas necessárias para concluir a demarcação da Terra Indígena Apiaká do Pontal e Isolados, de ocupação tradicional dos Apiaká, Munduruku e isolados, localizada no município de Apiacás, no extremo norte do Estado, na divisa com o Amazonas e Pará. 
Os estudos de identificação e delimitação da terra indígena foram aprovados em 2011, porém não foram encaminhados para que o Ministério da Justiça, responsável pela edição da portaria de declaração dos limites da terra indígena, providencie a demarcação física, homologação e registro em Cartório. De acordo com a procuradora da República Marcia Brandão Zollinger, "a morosidade do procedimento, paralisado há praticamente um ano e sete meses, sem remessa ao ministro da Justiça, tem ocasionado aos indígenas, além dos danos inerentes à inexistência do território demarcado, dificuldades ligadas à sua subsistência". A demora imposta ao povo Apiaká e Isolados em ver reconhecido seu território de origem perdura desde 1999, ou seja, há mais de 14 anos. 
Pernambuco -  duas ações civis públicas serão ajuizadas pela PRM/Serra Talhada para garantir a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas por comunidades indígenas no estado. Um dos processos refere-se à comunidade Pipipã, integrada por cerca de 1,3 mil indígenas, que ocupam área no município de Floresta.
A responsável pelo caso é a procuradora da República Maria Marília Oliveira de Moura. A outra ação, sob responsabilidade da procuradora da República Sílvia Regina Pontes Lopes, tem como alvo a situação da comunidade Pankará, que vive na Serra do Arapuá, em Carnaubeira da Penha.
Nos dois casos, o MPF busca decisão judicial que determine a conclusão do processo demarcatório das terras indígenas, com estabelecimento de prazo pela Justiça Federal. 
Uma terceira ação civil pública, de autoria da procuradora da República Sílvia Lopes, tem por objetivo garantir a conclusão do processo de desapropriação por interesse social da Ilha de Tapera, para criação de reserva indígena que abrigue os dissidentes da etnia Truká.
Conforme laudos antropológicos analisados pelo MPF, divergência entre grupos que antes viviam juntos na área já demarcada para os trukás, na Ilha de Assunção, inviabiliza a convivência dos indígenas na mesma terra. 
A PRM/Serra Talhada vai expedir também recomendação ao Incra para que seja concluído o processo de desintrusão da área indígena Atikum, que faz limite com a Comunidade Quilombola de Conceição da Crioulas, no prazo de um ano.
Conforme apurado pela procuradora da República Sílvia Pontes, a presença de pessoas não integrantes da comunidade indígena no local vem prejudicando o pleno usufruto da terra pelos atikums. O MPF recomendará ainda a Funai, Incra e Fundação Cultural Palmares a formação de grupo técnico para apurar as necessidades das populações indígenas e quilombolas vizinhas. 
Rondônia - o MPF encaminhou recomendação à Funai para que conclua o procedimento de revisão de demarcação da terra indígena Rio Negro Ocaia (município de Guajará-Mirim, da etnia Wari), cujos estudos técnicos foram aprovados pelo Ministério da Justiça por meio  da Portaria nº 185 de 14 de fevereiro de 2011. Além disso, o órgão tem 16 inquéritos civis públicos (investigações) abertos sobre questões relativas a áreas pleiteadas pelos indígenas e ainda não demarcadas, pretensões de revisões territoriais e invasões em territórios tradicionalmente ocupados. Veja detalhes aqui.
Roraima – o MPF expediu recomendação à superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para que seja feita a fiscalização e vistoria in loco das fazendas situadas em áreas invadidas na Terra Indígena Yanomami, na região do Rio Ajarani.
Durante essa semana em que se comemora o Dia do Índio, o Ibama deu início às fiscalizações. O MPF quer que sejam feitas autuações de todos os crimes ambientais e infrações administrativas constatados na região do Ajarani, em virtude das invasões ilegais, e seja feita aferição do dano ambiental na área fiscalizada, para posterior reparação pelos responsáveis.
Além disso, o MPF expediu recomendação à Funai para que seja feita confecção de plano de retirada de ocupantes e bens das fazendas localizadas na região do Ajarani, dentro da Terra Indígena Yanomami. O órgão quer ainda que a Funai proceda ao cumprimento do plano de retirada, ultimando a desintrusão da área.
Nesta sexta, o MPF também vai expedir recomendação à empresa OI para instalação de orelhões nas terras indígenas de Roraima. Ontem, promoveu o Debate sobre Mineração em Terras Indígenas,  com a participação de representantes indígenas, da Universidade Federal, do Departamento de Produção Mineral e do Instituto Socioambiental. Além disso, promoveu exposição fotográfica aberta ao público intitulada “Taai: um olhar sobre os indígenas de Roraima”.
Santa Catarina - a Procuradoria da República em Joinville expediu duas recomendações para a Funai, já que há um retardo injustificado no início do processo de identificação e demarcação das aldeias Yakã Porã e Yvy Dju/Reta. A situação de Yakã Porã, localizada na Estrada Brüsttein, em Garuva, e Yvy Dju/Reta, situada nas proximidades da BR 280, em São Francisco do Sul, vem sendo acompanhada pelo MPF desde final dos anos 90. 
Já a Procuradoria da República em Chapecó obteve na justiça decisão favorável para ação civil pública que condena a Funai a adquirir 500 hectares de terras destinadas aos índios kaingangs da aldeia Kondá. Na quarta-feira desta semana, a PR/SC também realizou vistoria na polêmica área da etnia guarani, com sede no Morro dos Cavalos, em Palhoça.
A visita foi um pedido do Ministério Público e foi acompanhada por representantes da Funai, da Justiça Federal, da Fundação do Meio Ambiente (Fatma), da Polícia Federal e das famílias de não índios. O local é alvo de muitas disputas, apesar da demarcação das terras indígenas ter sido publicada em Diário Oficial em 18 de dezembro de 2002. 

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História: documento que registra extermínio de índios é resgatado após décadas desaparecido

Por Felipe Canêdo

A expedição percorreu mais de 16 mil quilômetros e visitou mais de 130 postos indígenas onde foram constatados inúmeros crimes e violações aos direitos humanos. O governo ignorou pedido do Relatório Figueiredo para demitir 33 agentes públicos e suspender 17 (Marcelo Zelic/ Divulgação)
A expedição percorreu mais de 16 mil quilômetros e visitou mais de 130 postos indígenas onde foram constatados inúmeros crimes e violações aos direitos humanos. O governo ignorou pedido do Relatório Figueiredo para demitir 33 agentes públicos e suspender 17

Depois de 45 anos desaparecido, um dos documentos mais importantes produzidos pelo Estado brasileiro no último século, o chamado Relatório Figueiredo, que apurou matanças de tribos inteiras, torturas e toda sorte de crueldades praticadas contra indígenas no país – principalmente por latifundiários e funcionários do extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI) –, ressurge quase intacto. Supostamente eliminado em um incêndio no Ministério da Agricultura, ele foi encontrado recentemente no Museu do Índio, no Rio, com mais de 7 mil páginas preservadas e contendo 29 dos 30 tomos originais.

Em uma das inúmeras passagens brutais do texto, a que o Estado de Minas teve acesso e publica na data em que se comemora o Dia do Índio, um instrumento de tortura apontado como o mais comum nos postos do SPI à época, chamado “tronco”, é descrito da seguinte maneira: “Consistia na trituração dos tornozelos das vítimas, colocadas entre duas estacas enterradas juntas em um ângulo agudo. As extremidades, ligadas por roldanas, eram aproximadas lenta e continuamente”.

Entre denúncias de caçadas humanas promovidas com metralhadoras e dinamites atiradas de aviões, inoculações propositais de varíola em povoados isolados e doações de açúcar misturado a estricnina, o texto redigido pelo então procurador Jader de Figueiredo Correia ressuscita incontáveis fantasmas e pode se tornar agora um trunfo para a Comissão da Verdade, que apura violações de direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988.

A investigação, feita em 1967, em plena ditadura, a pedido do então ministro do Interior, Albuquerque Lima, tendo como base comissões parlamentares de inquérito de 1962 e 1963 e denúncias posteriores de deputados, foi o resultado de uma expedição que percorreu mais de 16 mil quilômetros, entrevistou dezenas de agentes do SPI e visitou mais de 130 postos indígenas. Jader de Figueiredo e sua equipe constataram diversos crimes, propuseram a investigação de muitos mais que lhes foram relatados pelos índios, se chocaram com a crueldade e bestialidade de agentes públicos. Ao final, no entanto, o Brasil foi privado da possibilidade de fazer justiça nos anos seguintes. Albuquerque Lima chegou a recomendar a demissão de 33 pessoas do SPI e a suspensão de 17, mas, posteriormente, muitas delas foram inocentadas pela Justiça.

Os únicos registros do relatório disponíveis até hoje eram os presentes em reportagens publicadas na época de sua conclusão, quando houve uma entrevista coletiva no Ministério do Interior, em março de 1968, para detalhar o que havia sido constatado por Jader e sua equipe. A entrevista teve repercussão internacional, merecendo publicação inclusive em jornais como o New York Times. No entanto, tempos depois da entrevista, o que ocorreu não foi a continuação das investigações, mas a exoneração de funcionários que haviam participado do trabalho. Quem não foi demitido foi trocado de função, numa tentativa de esconder o acontecido. Em 13 de dezembro do mesmo ano o governo militar baixou o Ato Institucional nº 5, restringindo liberdades civis e tornando o regime autoritário mais rígido.

 O vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo e coordenador do Projeto Armazém Memória, Marcelo Zelic, foi quem descobriu o conteúdo do documento até então guardado entre 50 caixas de papelada no Rio de Janeiro. Ele afirma que o Relatório Figueiredo já havia se tornado motivo de preocupação para setores que possivelmente estão envolvidos nas denúncias da época antes de ser achado. “Já tem gente que está tentando desqualificar o relatório, acho que por um forte medo de ele aparecer, as pessoas estão criticando o documento sem ter lido”, acusa.

Suplícios 

O contexto desenvolvimentista da época e o ímpeto por um Brasil moderno encontravam entraves nas aldeias. O documento relata que índios eram tratados como animais e sem a menor compaixão. “É espantoso que existe na estrutura administrativa do país repartição que haja descido a tão baixos padrões de decência. E que haja funcionários públicos cuja bestialidade tenha atingido tais requintes de perversidade. Venderam-se crianças indefesas para servir aos instintos de indivíduos desumanos. Torturas contra crianças e adultos em monstruosos e lentos suplícios”, lamentava Figueiredo. Em outro trecho contundente, o relatório cita chacinas no Maranhão, em que “fazendeiros liquidaram toda uma nação”. Uma CPI chegou a ser instaurada em 1968, mas o país jamais julgou os algozes que ceifaram tribos inteiras e culturas milenares.

Fonte: O Estado de Minas.

Belo Monte: trabalhadores contra a repressão

conlutas
Uma comissão com mais de 90 trabalhadores vinda do Sítio de Belo Monte realizou uma passeata no centro de Belém (PA), nesta segunda (15), e denunciou a ação repressora do CCBM (Consórcio Construtor Belo Monte) e do governo que, a pedido da empresa enviou a Força Nacional para o canteiro de obras. A marcha contou com o apoio de sindicatos da região, da central sindical CSP-Conlutas e da população.

Protestos com o mesmo objetivo também foram realizados no domingo.
Com faixas e cartazes escritos “CCBM será que voltamos à ditadura militar?”, “Governo Dilma, que papelão, a CCBM tem dinheiro e os operários escravidão”, os trabalhadores chamaram atenção dos paraenses e denunciaram a ação repressora da empresa e do governo que até o momento não os receberam para negociar.

Em busca de negociação, operários acionam órgãos do governo do Pará – Na manhã desta segunda, cerca de 90 trabalhadores, organizados pela CSP-Conlutas, lotaram a Câmara dos Vereadores de Belém para onde também levaram suas denúncias. Na sessão, o vereador Cleber Rabelo (PSTU) apresentou ao plenário as reivindicações da greve.

À tarde, os operários se concentraram na sede no Ministério Público do Pará em busca de uma audiência com a Procuradoria.

Após essa audiência estava prevista uma reunião com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Pará que também receberá denúncias dos trabalhadores. A instituição buscará meios de acionar o CCBM para tentar negociar a pauta de reivindicações da greve.
A Presidência do Tribunal Regional do Trabalho e o Ministério Público Federal também estão na agenda de reunião desses trabalhadores.

“Vamos acionar todos os órgãos públicos necessários, até que os trabalhadores sejam recebidos para negociar. O peão não quer militares em seu local de trabalho, quer o direito de poder se manifestar e fazer greve por melhores condições de trabalho sem que para isso tenha que pagar com seu emprego”, frisou o membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas Atnágoras Lopes.

Reivindicações – Foram listados mais de 35 itens de reivindicações e entregues ao departamento de relações sindicais do CCBM. As principais são: 40% de adicional por confinamento, baixada de 3 meses para todos, desfiliação geral do Sintrapav (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada do Estado do Pará), fim do 5 por 1, equiparação salarial, fim do desvio de função, entre outros.

Além disso, denunciam a repressão do Consórcio contra os trabalhadores e são contra presença de militares dentro do canteiro.

Protestam contra as demissões em massa e lutam pelo direito de poderem negociar enquanto comissão de trabalhadores, pois não reconhecem o Sintrapav como seu sindicato.
Os operários permanecerão na cidade, tendo em vista a expectativa de que ocorram negociações da greve que acontece desde 5 de abril.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Mais uma: MPF faz nova denúncia do ex prefeito Duciomar Costa (PTB)

Duciomar Costa/PTB, segue impune. Dessa vez haverá justiça?
Duciomar Costa e ex-assessores foram acusados juntamente com empresa envolvida e seus integrantes
 
16/04/2013 às 09h59 
 
O Ministério Público Federal (MPF) entrou na Justiça Federal com ação por improbidade administrativa contra o ex-prefeito de Belém Duciomar Costa e ex-dirigentes da prefeitura por desvio de R$ 3 milhões em recursos federais que deveriam ter sido destinados à implantação de 30 laboratórios de informática para estudantes de escolas públicas.

O procurador regional da República José Augusto Torres Potiguar acusou de enriquecimento ilícito e prejuízo aos cofres públicos o ex-prefeito, a ex-chefe de gabinete, Sílvia Rangel, a ex-diretora administrativo-financeira da prefeitura, Elizabeth Pereira, o ex-presidente da comissão de licitações, Alan Dionísio Leão Sales, o ex-assessor especial da prefeitura Sérgio de Souza Pimentel, e mais outros três integrantes da gestão Duciomar.

A empresa Aplicar Serviços Especializados de Pesquisa e Tecnologia e alguns de seus integrantes também foram acusados. O MPF pediu à Justiça Federal que o grupo seja obrigado a devolver os recursos aos cofres públicos. 

Potiguar também solicitou na ação que seja decretada a perda da função pública dos acusados e que os direitos políticos de todos sejam suspensos por até oito anos. Também foi pedido que durante dez anos todos sejam proibidos de fazer contratos com o poder público e que sejam obrigados a pagamento de multa equivalente a até cem vezes a última remuneração que receberam da prefeitura. 

Fraudes - Com base em tomada de contas do Tribunal de Contas da União (TCU), a ação judicial registra que as irregularidades foram detectadas na aplicação dos recursos federais transferidos ao município por meio do Programa de Inclusão Digital, Ministério da Ciência e Tecnologia. Houve direcionamento na licitação e diversos outros tipos de fraudes nos processos de contratação de bens e serviços, superfaturamento, irregularidades em pagamentos e utilização de documentos falsos.

Até uma tentativa de enganar a equipe de auditoria do TCU foi relatada pelos auditores no relatório citado pelo MPF. “Na tentativa de ludibriar os analistas que fiscalizavam a aplicação dos recursos do convênio, em 9 de novembro de 2006 foram apresentados, em um depósito da prefeitura, equipamentos como se fossem os decorrentes da contratação, entretanto, observou-se que os mesmos não correspondiam ao objeto do convênio”.

Íntegra da ação


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Justiça suspende operação Tapajós

Operação militar e policial estava sendo feita na região da Terra Indígena Munduruku, onde está planejada a usina hidrelétrica São Luís do Tapajós
 


O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, determinou a suspensão da Operação Tapajós, operação militar e policial promovida a mando do governo federal na região da Terra Indígena Munduruku, onde está planejada a usina hidrelétrica São Luís do Tapajós, no oeste do Pará.

O Ministério Público Federal (MPF), que pediu ao TRF-1 a suspensão, foi comunicado da decisão nesta terça-feira, 16 de abril. O contingente da Operação Tapajós está na área desde 25 de março e conta com integrantes da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Força Nacional de Segurança Pública e Forças Armadas.

Cacique Munduruku e o procurador do MPF Ubiratan Cazetta.
O MPF apresentou o pedido ao TRF-1 como recurso contra decisão da Justiça Federal em Santarém, que havia negado a suspensão da operação. Além de determinar a suspensão, o TRF-1 proibiu a realização de quaisquer medidas relacionadas à construção da usina hidrelétrica.

Para o tribunal, antes da realização de estudos que demandem o ingresso de técnicos em terras indígenas e de populações tradicionais deve haver consulta livre, prévia e informada, nos moldes do artigo 6º da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Segundo o recurso do MPF concedido pelo TRF-1, o processo de consulta deve ser facultado não apenas aos povos indígenas afetados, mas também às populações tradicionais atingidas, nos termos do artigo 1º da Convenção 169 da OIT, evitando-se a confusão entre o procedimento de consulta estabelecida na convenção com a oitiva estabelecida na Constituição Federal para o Congresso Nacional.

Foi determinado, ainda, que, após a realização da consulta, sejam elaboradas tanto a Avaliação Ambiental Integrada (AAI) quanto a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) dos impactos decorrentes da instalação de empreendimentos hidrelétricos em toda a bacia do Tapajós.

Para os procuradores da República que atuam no caso, Fernando Antônio Alves de Oliveira Jr., Felipe Bogado e Luiz Antonio Miranda Amorim Silva, a Operação Tapajós derrubava qualquer chance de diálogo e consulta como manda a Convenção 169. “Não existe diálogo, mas predisposição ao confronto", criticou o texto do recurso.

Processo nº 0019093-27.2013.4.01.0000

Íntegra da decisão

Link para consulta processual

Fonte: Ministério Público Federal no Pará.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Acusados de irregularidades em licença ambiental da hidrelétrica de Santo Antônio do Jari (PA) são notificados

usina hidrelétrica Santo Antônio do Jari
Mapa no blogue Jari News.
Justiça encaminhou ofício pedindo respostas sobre as acusações feitas pelo Ministério Público Federal em ação civil pública
 
A Justiça Federal já notificou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Ece Participações para que se manifestem sobre irregularidades no licenciamento do projeto da usina hidrelétrica Santo Antônio do Jari, na divisa do Pará com o Amapá. As irregularidades foram apontadas em ação judicial do Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA), que pediu a anulação da licença ambiental.
 
O MPF/PA pediu à Justiça que ordene o retorno à fase de análise do Estudo de Impactos Ambientais e Relatório de Impactos Ambientais (EIA/Rima) porque o documento apresenta dados incompletos. O MPF/PA aponta ainda que as condicionantes da licença prévia não foram cumpridas pelo empreendedor.
 
De acordo com a ação, o Ibama aceitou o EIA de Santo Antonio do Jari mesmo sem respostas a todas as questões do termo de referência, que deve ser rigorosamente seguido para que os estudos registrem corretamente os impactos.
 
“O não atendimento, em sua totalidade, do termo de referência compromete as próximas fases do processo de licenciamento, aumentando o risco da ocorrência de sérios impactos socioambientais, com graves consequências lesivas ao meio ambiente, devido à falta de atendimento às disposições elaboradas e emitidas pelo Ibama”, diz o MPF/PA.

Ainda segundo a ação, a ausência de alguns dos diagnósticos necessários no estudo de impactos ambientais prejudica a  possibilidade da participação popular e a intervenção direta do cidadão no processo de licenciamento ambiental.

“O aceite indevido causa prejuízo incomensurável à sociedade civil. É que esta teve cerceado o prazo para conhecimento do conteúdo dos estudos”, diz a ação, assinada procuradores da República Bruno Araújo Soares Valente e Felício Pontes Jr. O juiz Arthur Pinheiro Chaves está responsável pelo processo na Justiça Federal.

Processo nº 0005244-25.2013.4.01.3900 – 9ª Vara Federal em Belém.

Acompanhamento processual 
 Íntegra da ação

Informe do Ministério Público Federal no Pará, a partir do Amazônia Informa.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Shell e Basf irão pagar indenização por contaminação em fábrica de agrotóxicos


Multinacionais assinam acordo se comprometendo a pagar atendimento médico a mais de mil ex-trabalhadores e indenização de R$ 370 milhões

Por Anali Dupré e Stefano Wrobleski

Foi homologado nesta segunda-feira, 8, acordo de indenização milionário que Shell e Basf fecharam com os ex-trabalhadores da fábrica de agrotóxicos controlada pelas empresas que funcionou de 1974 a 2002 no município de Paulínia, no interior de São Paulo. As multinacionais comprometeram-se a pagar atendimento médico vitalício a mais de mil ex-trabalhadores, diretos e terceirizados, e seus dependentes, o que torna o caso um dos mais abrangentes da história do Tribunal Superior do Trabalho, onde a ação seria julgada se não houvesse o acordo.

Além disso, elas devem pagar ainda R$ 200 milhões em indenização por danos morais coletivos e aproximadamente outros R$170 milhões aos ex-trabalhadores e seus dependentes, a título de indenização individual.

A ação teve início em 2007, depois que diversos estudos ligando a contaminação do lençol freático pela empresa e a saúde dos trabalhadores foram analisados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Para o MPT, além de terem contaminado o meio ambiente por produzir agrotóxicos em desacordo com as normas ambientais, a Shell e a Basf foram negligentes “em relação à saúde, à vida e à integridade física e psíquica” dos trabalhadores.

Em nota, a Shell disse considerar o acordo “uma excelente oportunidade para o término da disputa judicial”, mas que  não reconhece a contaminação dos trabalhadores: “A ocorrência de contaminação ambiental não implicou, necessariamente, em exposição à saúde de pessoas”. Em entrevista à Repórter Brasil, o advogado dos trabalhadores Vinícius Cascone ironizou o posicionamento da companhia: “Significaria dizer que eu pulei numa piscina cheia de água e, ao sair, não fiquei molhado”.  A Basf, também em nota, confirmou o acordo e afirmou “compromisso em posicionar-se com transparência em todos os aspectos relacionados a este assunto”.

Os drins

Dentre os agrotóxicos produzidos pela fábrica estavam os chamados drins (Aldrin, Dieldrin e Endrin), que foram inventados nos EUA na década de 1940 e largamente utilizados no cultivo de algodão e milho, além do controle de cupins. Por possuírem alta persistência no meio ambiente e se propagarem pela cadeia alimentar, seu uso na agricultura foi banido em 1974 nos EUA depois que a Agência de Proteção Ambiental do país (Usepa) confirmou o alto risco de câncer em animais e contaminação em alimentos.

Assim, a Shell foi obrigada a fechar sua fábrica de pesticidas que estava em atividade desde 1948. No Brasil, os drins foram parcialmente proibidos para uso e comercialização somente em 1985. Em depoimentos registrados em vídeo pela reportagem, trabalhadores relatam que ficavam expostos aos produtos tóxicos com regularidade e que acidentes eram comuns. Hoje, sofrem com problemas graves de saúde. Assista aos depoimentos:



Os drins fazem parte dos Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs) e, em 1998, entraram em uma lista do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente que os colocou entre os doze POPs mais tóxicos do mundo.

A fábrica

Ainda em 1974 a Shell iniciou, no município de Paulínia, a construção de uma fábrica para a produção de diversos tipos de agrotóxicos, como os drins. A produção teve início três anos depois, em 1977. A construção foi fiscalizada pela Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental), que apontou, em 1975, que a localização da fábrica não era “conveniente”: por estar muito próxima do rio Atibaia, haveria uma possibilidade, “ainda que remota”, de contaminação de suas águas.

O rio Atibaia tem mais de cem quilômetros de extensão. Suas águas, apesar de poluídas pelo esgoto despejado sem tratamento pelas cidades por onde passa, abastecem mais de 2 milhões de moradores do interior de São Paulo. A pesca no rio ainda é uma prática comum das populações locais.

Em 1993, como parte do acordo de venda da fábrica para a American Cyanamid Co. (comprada, em 2000, pela Basf), a Shell teve de fazer uma auditoria ambiental que constatou que o meio ambiente e o lençol freático estavam contaminados pelos produtos que fabricava. Segundo a companhia, no entanto, a contaminação estava restrita à área da fábrica.

Dois anos depois, a Shell foi obrigada a fazer uma autodenúncia à Curadoria do Meio Ambiente de Paulínia, reconhecendo os danos ambientais. Também se comprometeu a recuperar a área em um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público (MP). De acordo com a Shell, não havia qualquer risco de contaminação dos trabalhadores da fábrica. Em 2000, por pressão dos moradores das chácaras da região, a Cetesb coletou amostras de fora da área da fábrica. Eles alegavam que a água proveniente do lençol freático tinha um forte odor. A Cetesb, então, constatou que a contaminação havia extrapolado os limites da fábrica.

Em dezembro de 2002, a Basf anunciou o fechamento da fábrica e a demissão de todos os funcionários. No mesmo período, a vigilância sanitária de Paulínia interditou a área residencial onde ficavam as chácaras e evacuou o local.

Entre 1998 e 2006, dezenas de ex-trabalhadores e ex-moradores entraram com ações individuais contra as duas empresas por conta dos danos ambientais e dos alegados riscos à saúde humana a que foram submetidos. Em depoimento à Promotoria de Justiça, um dos ex-funcionários alegou que a Shell manteve quatro aterros clandestinos na área da fábrica e que o incinerador era utilizado também por outras empresas da região.

Nos anos seguintes, a área onde a fábrica ficava e as chácaras da região foram compradas pela Shell. Uma ex-moradora, no entanto, se recusa a aceitar as condições oferecidas pela companhia e mora há dez anos em um quarto de hotel à espera da resolução da disputa na Justiça.                                                                                          
Redondezas da fábrica foram interditadas em 2003
por "risco à saúde". Foto: Divulgação
Contaminação

A vigilância sanitária da Prefeitura de Paulínia produziu, em 2003, um estudo com 181 moradores (aproximandamente 70% da população) do bairro Recanto dos Pássaros, onde a fábrica estava instalada. No sangue de muitas dessas pessoas foram detectados metais pesados – como chumbo, cádmio e arsênico – e os agrotóxicos DDT e Aldrin.

O estudo ainda pondera que, se a população do bairro tivesse sido retirada do bairro pelo “risco potencial” à saúde quando, em 1995, a companhia reconheceu perante à prefeitura os danos ambientais causados, quase metade (47%) dos moradores não teriam sido expostos aos contaminantes, pois haviam nascido ou se mudado para o Recanto dos Pássaros depois de 1995.

A Associação dos Trabalhadores Expostos a Substâncias Químicas (Atesq) levantou que, desde 2007, com o início do processo na Justiça, mais de 60 ex-trabalhadores já faleceram e tinham, em média, 55 anos de idade. Ao menos 20 óbitos foram registrados em decorrência de algum tipo de câncer.

Dez anos morando em um quarto de hotel

Ciomara Rodrigues não tem tanto a comemorar, mesmo depois do acordo na Justiça. Há dez anos, ela briga na Justiça por uma indenização mais adequada para a chácara em que viveu de 1974 a 2003. Forçada a deixar o local há dez anos, quando as propriedades da região foram interditadas pela Prefeitura de Paulínia, em vez de vendê-la à Shell, como os demais moradores fizeram, ela preferiu acionar a Justiça. “O dinheiro que a empresa quer pagar pela minha propriedade não dá nem para comprar uma casinha na periferia de Paulínia”, diz.                                                                                                                                                                                                                   

Enquanto a ação não for julgada, a Justiça obrigou a Shell a pagar um quarto de hotel para Ciomara e seus dois filhos. Isso faz dez anos. O processo caminha ainda na primeira instância. 
Como o acordo homologado diz respeito somente aos trabalhadores, sua situação deve permanecer indefinida.
Revoltada, ela criou um blog que atualiza desde 2004 com cada novo andamento do caso. Como é uma das poucas que pode visitar a área interditada pela prefeitura – já que a chácara ainda é propriedade sua – ela denuncia irregularidades nas obras de recuperação ambiental.
                                                 

Entre os problemas apontados por ela, está o fato de os operários que trabalham nas obras de recuperação do local não usarem o mesmo equipamento de proteção individual específico para se protegerem dos contaminantes, equipamento que ela é obrigada a usar toda vez que visita a área, conforme revelam as fotos ao lado, ambas reproduzidas de seu blog.

Mais sobre o assunto: 
Trabalhadores podem fech

Fonte: Repórter Brasil.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Todo apoio e solidariedade aos trabalhadores de Belo Monte em greve

Cerca de 5 mil operários do canteiro de obras de Pimental decidiram paralisar os trabalhos no início da tarde desta sexta, 5, informa o Sindicato da Construção Leve de Altamira.

De acordo com os trabalhadores, entre os 21 itens da pauta de reivindicação estão o pagamento de adicional de 40% para operários alojados no canteiro (o chamado adicional de confinamento, previsto mas não efetuado pelo Consórcio Construtor Belo Monte – CCBM), equiparação salarial em funções iguais para todos os canteiros de obra da usina, e fim do sistema 5 por 1, no qual as folgas ocorrem em dias aleatórios e não há adicional de horas extras nos finais de semana.

Força Nacional no canteiro de Belo Monte. Fonte: Língua Ferina.
Os trabalhadores também reclamam do não pagamento de adicional por insalubridade e periculosidade, da péssima qualidade da alimentação e da constante presença de policiais e homens da Força Nacional (foto) armados nos canteiros. “Muitos homens acabam ficando sem o café da manhã em função do horário do início do trabalho, e hoje encontraram até insetos vivos na comida. 

Já a questão da presença das forças de repressão incomoda muito, os trabalhadores se sentem num presídio. Para se ter uma ideia, na última  demissão de 80 operários [no final de 2012], quem trouxe a lista de nomes foi a Força Nacional de Segurança”, explica Maria Serafim, presidente do sindicato.

Os 80 trabalhadores demitidos foram denunciados pelo espião contratado pelo CCBM para monitorar operários e, posteriormente, o Movimento Xingu Vivo para Sempre (veja confissão aqui). Depois de descoberto no final de fevereiro,  o funcionário do CCBM, que recebia R$ 5 mil pelos serviços de espionagem, afirmou que as informações colhidas por ele eram disponibilizadas para a Agencia Brasileira de Inteligência (ABIN).

Fonte: Xingu Vivo.

Bermann: “A energia hidréletrica não é limpa, nem barata”

Por Manuela Azenha
Prof. Célio Bermann. Foto: USP/Divulgação
O professor de pós-graduação em Energia do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP desmistifica os benefícios de o Brasil aproveitar o potencial energético dos rios da região Amazônica: “Belo Monte representa simbolicamente a possibilidade de transformar todo o territorio amazônico em um grande conjunto de jazidas de megawatts”.

Célio Bermann foi assessor do Ministério de Minas e Energia durante os dois primeiros anos do governo Lula e se afastou em desacordo com o que considera desvirtuamento da política do governo para o setor. Crítico assíduo do planejamento energético brasileiro, Bermann não só rejeita a construção de usinas hidrelétricas como a de Belo Monte, mas propõe uma nova direção de desenvolvimento econômico para o país.

Qual é a importância econômica da Usina de Belo Monte para o Brasil?

Bermann: A importância da usina deve ser medida pela sua capacidade de produção de energia, pelo tempo que a energia produzida estará disponível para o consumo da sociedade e pelos problemas de ordem social e ambiental que essa usina representa, inclusive sob o ponto de vista de custos. A importância econômica da Usina de Belo Monte para o Brasil é negativa, porque ela vai custar muito. O governo fala em 19 bilhões de reais de investimento, mas as empresas envolvidas na obra, na fabricação dos equipamentos, dizem que a obra não sai por menos de 30 bilhões. Os problemas sociais e ambientais, muitos deles, não têm custo financeiro.  Mas imagine a perda do valor cultural do rio Xingu, que é sagrado para as populações indígenas. E esse tipo de raciocínio não está incorporado na decisão de construir um empreendimento. A obra é superdimensionada, porque a quantidade de água para tocar a usina na capacidade proposta, de 11 mil MW (Itaipu produz 14 mil MW, para se ter uma idéia do tamanho da usina), estará disponível apenas três meses ao ano. Na época de estiagem, por exemplo, em setembro e outubro, a usina não vai produzir mais do que 1 mil MW. Então por que investir numa obra com essa dimensão se o retorno econômico/financeiro é baixo? Não é a toa que o capital privado desistiu de participar da construção.

E por que então construí-la? Qual é o interesse do governo se não haverá esse retorno?

Bermann: Eu vejo a obra de Belo Monte como um projeto de longo prazo. É preciso levar em consideração que mais da metade do chamado potencial hidrelétrico, para construir hidrelétricas no Brasil, está localizado na região amazônica, onde há problemas de ordens social e ambiental. O fato de ter esse potencial para a construção de hidrelétricas faz com o governo aponte para essa direção irreversível: a de construir essas usinas, custe o que custar. Por que isso? O que chama atenção, como sempre, é a perspectiva do apagão, de se ter falta de energia. Ninguém quer ficar sem energia elétrica. Então essa forma de propagandear, de alardear que vai ter apagão, faz com que se aceite usinas com essas características. Não é particularmente o governo Lula, porque essa obra está sendo pensada há 30 anos.

O problema é que o governo Lula vai ficar na história como aquele governo que decretou o fim das populações indígenas e da cultura na região do Xingu. Para responder o por quê dessa obstinação do governo, é porque se conseguirem validar a construção da usina de Belo Monte, todas as outras usinas vão se validar também, principalmente no critério de impactos socio-ambientais. A Balbina (1) é conhecida como a pior concepção de hidrelétrica do mundo, porque ela está na planície amazônica, ocupa um reservatório enorme de mais de 2500 km2, para gerar 250 MW, sendo que a potência firme dela é de apenas 120 MW. Numa situação dessa, o critério lógico é abandonar o projeto. Isso não foi feito, na década de oitenta. De lá pra cá, aumentou o número de planos de hidrelétricas. Belo Monte representa simbolicamente a possibilidade de transformar todo o território amazônico em um grande conjunto de jazidas de megawatts. Embora frágil, com populações tradicionais que precisam ser respeitadas, populações indígenas que precisam ser consideradas, a perspectiva que Belo Monte aponta é de priorizar a geração de energia a partir das águas do rio Amazonas. E o resto? Bem, o resto é o resto.

O Brasil tem um papel de protagonismo internacional em geração de energia limpa. No caso das hidrelétricas, temos enormes reservas de água que podem ser vantajosas para o país. Não se deve aproveitar essas vantagens?

Bermann: O maior erro desta política energética que está sendo implementada é o fato dela se apoiar em inverdades. Uma delas é de que a energia hidrelétrica é limpa e barata. Ela não é. Estudos mostraram que Balbina, Tucuruí e Samuel, as três maiores hidrelétricas construídas na região amazônica até agora, emitem gases de efeito estufa mais ou na mesma proporção que usinas a carvão mineral. Isso pode parecer uma surpresa, mas nos primeiros dez anos de operação de uma usina da Amazônia, a matéria orgânica, a mata, ela apodrece porque a água a deixa encoberta permanentemente.  E o processo de apodrecimento é muito forte, acidifica a água e emite metano, que é um gás 21 vezes mais forte que o gás carbônico, principal gás do efeito estufa. Isso é conhecido pela ciência mas não é considerado porque não é de interesse de quem concebe essas usinas. O que interessa é a grande quantidade de dinheiro que vai ser repassado para as empresas construtoras de barragens, turbinas e geradores. O restante, o problema ambiental, as populações que serão expulsas, a cultura indígena que está sendo desconsiderada, isso não entra na conta.

Ainda não entendi porque construir essa usina se a energia é suja, cara e provoca todos esses impactos socioambientais. O Brasil precisa dessa energia ou não?

Bermann: Se o Brasil persistir nessa direção de desenvolvimento econômico, sim. Mas é isso o que precisa ser mudado. No Brasil, 30% da energia gerada é gasta por empresas que consomem muito: fábricas de aço e de alumínio, principalmente. Todas as empresas presentes na Amazônia, e que usam a energia de Tucuruí, são produtoras de alumínio, que é exportado. Então é essa lógica que está por trás disso. Fala-se em crescimento econômico mas a fabricação industrial é direcionada para essa produção e para a exportação.
Seguindo essa lógica, fatalmente o Brasil precisará de energia. O problema que precisa ser aberto para a população brasileira é se a gente quer um crescimento econômico com esse perfil. Ou se com a mesma energia disponível, não podemos produzir produtos que contenham mais tecnologia, mais mão de obra, que tenham maior valor agregado e aí sim, exportá-los. É o que o Japão faz. Na década de 80, todas as indústrias de alumínio foram fechadas. O Japão passou a importar o alumínio, transformá-lo em chips, para então vendê-los com um valor 20 vezes maior do que ele pagou pelo alumínio utilizado. É possível crescer economicamente gastando menos energia, se diversificarmos a nossa matriz energética para que ela não priorize a hidroeletricidade, como ela vem sendo priorizada hoje.

É falsa a idéia de que ela é mais barata do que as outras. Colocado na ponta do lápis, esse custo de 30 bilhões da usina de Belo Monte será financiado pelo BNDES, com o nosso dinheiro, porque as empresas privadas não quiseram entrar. O banco público vai bancar 80% dos investimentos e pagar empresas privadas para construir a usina. E a energia elétrica, muito provavelmente, vai servir para ampliar esse perfil industrial eletro-intensivo. Vai vir alguma coisa para o consumidor residencial brasileiro, mas poderíamos conseguir essa energia diversificando as fontes, não tendo essa idéia de privilegiar grandes blocos de consumo, como esse tipo de indústria faz. A gente tem, na economia brasileira, demonstrações de que existem setores que atendem ao requisito de menor consumo de energia, maior tecnologia e maior incorporação de mão de obra. Então por que não insistir nessa direção?
 

E quais são esses setores?

Bermann: Por exemplo, a fabricação de aviões. Dentro da pauta de exportação brasileira, é o que mais se sobressai, em termos de receita que advém da venda desses equipamentos. Não dá para persistir na idéia de um país da dimensão do Brasil, com as necessidades sociais que tem, como exportador de soja, de café, de açúcar, de etanol…Exportar aço, celulose, alumínio, é restringir a capacidade que o conhecimento brasileiro tem, a capacidade de trabalho que o país tem de consumir energia de uma forma mais inteligente, de uma forma que degrade menos a força de trabalho de sua gente e o meio ambiente.

Você acha que a sociedade brasileira está a par do que está acontecendo na Amazônia?

Bermann: É fundamental que a discussão das usinas hidrelétricas da Amazônia seja disseminada para que as idéias que hoje justificam essas obras possam passar pelo crivo da sociedade, e não apenas de especialistas, e aí eu me incluo, que mostram seu ponto de vista cientifico do por quê condenar o empreendimento dessas obras. O projeto brasileiro é de construir 28 usinas na região amazônica. Hoje tem quinze, mas de porte são Tucuruí, Balbina e Samuel. Desse conjunto que se pretende, mostra que 80% da capacidade de geração de energia elétrica prevista até 2020 vai vir de 28 usinas hidrelétricas da Amazônia.