Com preces a Cristo, menções à Bíblia, pedidos de perdão, falsas
testemunhas de defesa e ameaças às de acusação, o apontado de ser o
mandante de um crime de pistolagem e seus advogados conseguiram
convencer o júri da ausência de provas contra ele. José Rodrigues
Moreira era acusado de mandar matar o casal de extrativistas José
Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, em maio de
2011. Mas foi absolvido. Está livre. Seu irmão, Lindonjonson Silva, e
seu comparsa, Alberto Nascimento, foram condenados pela execução do
casal. O primeiro cumprirá pena de 42 anos e 8 meses pelo duplo
homicídio. O segundo, 45 anos. Ainda assim, apenas por maioria dos
votos.
Em Marabá, no Pará, o júri não encontrou nenhuma conexão entre as
ameaças que José Rodrigues fazia ao casal e o assassinato. Ao contrário,
a vítima ainda foi considerada culpada por sua própria morte, pois, no
caso das condenações dos dois assassinos, o júri considerou que o
“comportamento da vítima contribuiu para o crime, pois a vítima
enfrentou o réu José Rodrigues, tentando fazer justiça pelas próprias
mãos, com a ajuda de terceiros, posseiros e sem-terra, para impedir o
corréu de ter a posse de imóvel rural, quando poderia ter procurado
apoio das autoridades constituídas”.
“Estou perdido”, disse, atônito, José Maria Gomes Sampaio após o
veredicto. Casado com Laísa Santos Sampaio, a irmã de Maria, ele foi uma
das principais testemunhas de acusação. Seus olhos estavam não apenas
vermelhos por causa do choro, mas também do medo. Perguntado se voltaria
para o assentamento, onde teme ser assassinado, ele simplesmente
repetiu: “Estou perdido”. Sua esposa, Laísa, é ameaçada de morte e tem
escolta policial, de acordo com Igo Martini, coordenador-geral do
Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos da Secretaria
de Direitos Humanos da Presidência. Martini esteve presente em todo o
julgamento e garantiu que uma testemunha fundamental para a condenação
dos dois executores também está em contato com a secretaria para ser
oferecida a proteção.
Nilton de Lima fazia uma cerca na manhã do dia 24 de maio de 2011,
quando viu passar Lindonjonson na moto com um acompanhante. Ele
confirmou no Tribunal que era mesmo Lindonjonson, pois havia estado com
ele em um bar dias antes. Na saída do Tribunal, um irmão de José
Rodrigues trombou com ele. Bateu em seu peito, antes de ameaçar: “Sua
batata também está esquentando”.
Laísa testemunhou na frente dos acusados e, apesar de estar inscrita
no programa federal, ela não possui proteção na área e não sabe se
voltará ao assentamento. Emocionada, não conseguia comentar o veredicto.
Indignado, o advogado da Comissão Pastoral da Terra, José Batista,
amigo das vítimas, também não quis comentar.
Durante o julgamento, outra testemunha, Joeuza Pereira da Silva,
disse ter visto Lindonjonson no exato momento do crime numa moto no
interior de Novo Repartimento, outra cidade do Pará. Seria o álibi para
salvar o irmão de Rodrigues. Mas sua mentira foi desvendada pela
promotora pública Ana Maria Magalhães. Quando perguntada “quem seria o
iluminado que descobriu que a senhora teria visto a vítima?”, Joeuza
passou a chorar e parou de falar. Responderá pelo crime de falso
testemunho.
Durante o depoimento de José Rodrigues, ele ajoelhou-se e
pediu perdão, segurando uma pequena Bíblia. Após negar qualquer
envolvimento e dizendo que não teria reagido à disputa do lote que deu
origem ao conflito, apenas “entregando a Deus”, ele passou a agir de
forma a impressionar os jurados. De joelhos e com a mão levantada, ele
agradeceu aos céus, pediu bênção a todos e disse que não devia nada nem
tinha mandado matar ninguém. “Sou pessoa trabalhadora”, afirmou. “Repito
mais uma vez: eu não devo, eu não devo, eu não devo”, e chorou.
Balbuciou palavras bíblicas e pediu a Jesus Cristo para ser devolvido a
seus filhos, que estavam ali na frente. Disse ser pai de família. A
reação não havia surpreendido o público e a cena pareceu planejada. Para
a primeira jurada do lado esquerdo, não. Ela se emocionou. Deixou
escorrer lágrimas e sentiu-se tocada. A jurada é evangélica.
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