Única – Por que escrever sobre José Sarney?
Dória – Muito me admira não ter sido lançado nenhum outro livro sobre ele no ano passado, afinal, JS foi a personalidade de 2009. Completou 50 anos de vida política e é um personagem natural da história brasileira. Havia inclusive um movimento de ‘limpeza’ da biografia dele, com publicação de biografia, autobiografia e cinebiografia engatilhados, mas que foram transferidos para este ano devido aos escândalos. Em abril ele completa 80 anos de vida.
Única – Não é a primeira vez que o senhor se interessa em publicar livros ou artigos sobre ele…
Dória – Como repórter de geral (me considero assim) sempre busco assuntos de interesse do leitor. Além disso, o José Sarney deve muito ao país. Não pode passar para a história como um democrata, como ele deseja. O Estado do Maranhão é o maior exportador de gente do Brasil, os garimpeiros do Suriname, que o digam. A corrupção e o loteamento das terras provocaram a chacina dos sem-terra em Eldorado dos Carajás. As crianças morrem de desnutrição. No contexto de influência desse homem poderoso nomear parentes é ‘fichinha’.
Única – Quanto tempo levou para reunir as informações do livro?
Dória – Sessenta anos (risos). A última reportagem que escrevi foi justamente sobre a posse dele (Sarney) pela terceira vez à presidência do Senado. Nessa época, o filho mais velho, o Fernandinho, estava encrencado. E talvez por isso ele aceitou a disputa. Deu um golpe no Judiciário e conseguiu recolocar a filha (Roseana) no governo, agora livrar a cara do filho da prisão era mais complicado que comprar o pessoal ‘da beca’, algo que já faz há muito tempo.
Única – De que maneira ‘Honoráveis Bandidos’ tomou forma?
Dória – Busco me orientar pelo método onírico-dialético, que é ir atrás do que está na cara, mas os jornalistas deram para fugir do óbvio. Agora método não existe, como repórter, o fundamental é um pouco de sorte: encontrar as pessoas certas, os livros certos e o enfoque certo no tempo certo. Mais que isso seria aprofundar demais coisas muito simples.
Única – Como o senhor avalia essa ligação do Sarney com o presidente Lula?
Dória – Que fique bem claro, sou apartidário. Não é crítica e sim constatação: Lula governa, mas quem manda é Sarney. Já denunciava esse ‘esquemão’ desde 2002, com o livro Candidata que Virou Picolé. Os personagens são os mesmos, aqueles seres insaciáveis, que nós pessoas comuns não entendemos por que tais homens precisam acumular tanto capital e poder, podemos dizer que são viciados em grana, em dinheiro público. São os vampiros da vida real. E o ex-governador Dante de Oliveira era um deles.
Única – Já que o senhor tocou nesse assunto, a família do ex-governador de Mato Grosso já anunciou na imprensa local que irá processá-lo…
Dória – Esse é um problema deles, se isso lhes cabe, que façam. Fui muitas vezes processado, mas jamais nenhum desses ‘ofendidos’ logrou êxito no seu intento. O que Thelma, viúva do Dante, está tentando fazer é ‘agrandar’ a memória do marido que foi uma das grandes promessas não cumpridas. Ele se amiudou politicamente e a população do Estado entendeu, tanto que Dante não conseguiu emplacar para senador em 2002. Não adianta tapar o sol com a peneira.
Única – Mas a deputada Thelma reclama por não ter sido procurada pelo senhor.
Dória – Não procurei, nem vou procurar. Essas pessoas são ouvidas prioritariamente, como se diz, são ‘mimoseadas’ pela imprensa de Cuiabá e do Brasil. O outro lado para os poderosos é livrar a cara deles. Mas quem não sabe sobre a força da grana da família Oliveira? Como se justificam as fazendas, haras, a espantosa fortuna que surgiu do nada e que eles têm a burrice de exibir por aí? Eu já cumpri meu papel. Não sou eu quem tem de investigar, nem rastrear. Quanto à família, que eles se virem para provar a origem da ‘bufunfa’.
Única – O senhor fazia ideia da repercussão do seu livro?
Dória – Realmente foi um espanto. O mais milagroso é ele não ter sido embargado. Meus agradecimentos são para Sarney, um viciado em dinheiro público, que me presenteou com a história. Não tenho nada contra ele, mas contra o que fez ao Maranhão. JS é o próprio Herodes. A filha Roseana é Ana Jansen (lendária mulher que viveu em São Luís no século 19, uma das mais poderosas personalidades provincianas famosa por suas crueldades com seus escravos e ditatorial no trato até com as autoridades).
Única – Mudam-se os cenários, mas os personagens continuam os mesmos, é desanimador…
Dória – Podemos comparar esses seres insaciáveis aos vampiros. Hoje temos muitos livros e filmes fazendo sucesso sobre o tema. É isso mesmo, eles não morrem nunca e continuam no poder indefinidamente. Mas não vejo outro caminho para mudar o rumo da história a não ser através da política, é necessária, é uma atividade que admiro muito, mas realmente não é fácil.
Única – E o quadro para as próximas eleições presidenciáveis?
Dória – Meu impasse está nas soluções trazidas pelas alternativas. De um lado temos o governo Lula, que conseguiu criar a ‘mendicância organizada’ e de alguma forma conseguiu, transferiu renda para as populações mais carentes. Agora, assombroso foi vê-lo fazendo um pacto com os ‘vampiros’. A desculpa sempre é a governabilidade, mas ainda assim é assustador, pois vai contra todos os sonhos dele. Do outro lado, o que temos? A turma do José Serra, que não tem compromisso nenhum com a população pobre.
Única – O senhor escreve livros do ‘contra’, e não é fácil fazer isso em momento em que os juízes têm proibido inclusive a circulação de matérias e até mandado prender blogueiros.
Dória – Sim, sempre a máfia de toga interferindo. Para piorar, o poder de ação da Polícia Federal e o Ministério Público também estão sendo cerceados. Não é por acaso, e todo mundo sabe. Agora o fato de a grande mídia não cumprir bem seu papel também se explica pelas inúmeras concessões de tevês e rádios nas mãos de ‘coronéis’ e políticos corruptos (como ACM no governo FHC).
Fonte: Revista Única
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