quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Protesto contra Belo Monte

Do blog Jornalismo dá asas
Cidadania e Meio Ambiente - 12/12/2009

Um protesto pacífico, mas cheio de convicção e energia, organizado pelo Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo para Sempre e Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Pará (UFPA), marcou o dia 11 de dezembro em Belém. Pelas ruas dos bairros do Guamá e da Terra Firme ativistas sociais que são contra a construção das barragens da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (denominada pelos manifestantes de Belo “Monstro”), no rio Xingu, sudoeste do Pará, marcharam desde o terceiro portão da UFPA até a sede da Eletronorte, na avenida Perimetral.

O objetivo foi protestar contra a forma que o Governo Federal vem conduzindo a política de implantação de grandes projetos na região Amazônica e entregar a “Carta em Defesa da Vida” (na íntegra, abaixo), assinada por diversas entidades.

Uma comissão foi formada para fazer a entrega do documento à direção da empresa. Mas depois que os manifestantes souberam que a comissão não seria recebida e perceberam que havia pouco caso da direção em atendê-los eles ficaram ainda mais insatisfeitos e conseguiram passar pelo bloqueio de dois policiais militares e funcionários ocupando a Eletronorte (chamada, também por eles, de “Eletromorte”).


Dentro da empresa , eles se dirigiram à sala de reunião, onde foram “recebidos” pelo advogado da Eletronorte, Arielson Santos, e pelo engenheiro Nilson Barbosa, pois o diretor-presidente da Eletronorte, Jorge Nassar Palmeira, ao qual a carta estava endereçada, não estaria no local. Lá, as lideranças levantaram vários problemas do projeto e a carta foi lida por Antônia Melo (foto à direita), uma das principais vozes na defesa da vida do Xingu e diretora do Comitê Xingu Vivo para Sempre. O documento deverá ser encaminhado à Eletrobrás e ao Ministério das Minas e Energia, que gerencia as obras de construção da usina.

Além de membros do comitê e do movimento estudantil, estiveram presentes representantes de movimentos e comunidades dos rios Tapajós e Madeira - que estão na lista do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para serem atingidos por projetos de hidrelétricas-, indígenas, lideranças da região da Transamazônica, o irmão da missionária Dorothy Stang, David Stang, o bispo da Prelazia do Xingu, Dom Erwin Kraütler, entre outros ativistas sociais.

Anderson Castro (foto abaixo), coordenador-geral do DCE da UFPA, alertou que “a população precisa tomar conhecimento sobre os reais interesses por trás da construção da usina, pois as barragens vão atingir diretamente a saúde, a vida, a moradia e o sustento de comunidades ribeirinhas e indígenas, além de destruir a biodiversidade da floresta”.

Aldalice Otterloo, coordenadora do Instituto Universidade Popular (Unipop), disse que existe necessidade de a luta continuar. “Precisamos assumir um compromisso não apenas político, mas um compromisso ético de respeito pela vida”.

O professor do curso de economia da UFPA, Aluízio Leal (foto abaixo), que participou do Painel de Especialistas da UFPA que avaliou o projeto de Belo Monte encomendado pelo governo, falou que esse é mais um dos projetos pensados para a Amazônia que não atenderá aos interesses da população local. Ele destacou, ainda, que essa é mais uma ação que acontece na região, desde os anos 60, e que se estende até hoje, sem que os amazônidas sejam ouvidos. "Infelizmente, o Governo Lula dá continuidade a um projeto que existe desde o tempo dos militares e que sempre foi feito no bico da botina”, lembra.

Abaixo, segue a carta protocolada na Eletronorte.

Carta em Defesa da Vida

Ilmo. Sr.

Diretor-presidente da Eletronorte.

Jorge Nassar Palmeira

Nós, abaixo-assinados, viemos mais uma vez manifestar nosso inconformismo com a intenção demonstrada pelo governo federal e por esta empresa de prosseguirem à ferro e fogo com o processo de construção da Hidrelétrica de Belo Monte, a despeito das inúmeras manifestações contrárias por parte da sociedade.

Como já foi sobejamente demonstrado, a usina de Belo Monte, se realizada, exigirá como parte de seu custo proibitivo a destruição da Volta Grande do Rio Xingu com seus 100 quilômetros de corredeiras, lagos e cachoeiras, a inundação de vasta área florestal com o deslocamento forçado de pelo menos 20 mil pessoas, o lançamento na atmosfera de gases de efeito estufa em gigantescas quantidades e a ameaças à sobrevivência de uma rica biodiversidade.

Além disto, as cidades da região que possuem precária infra-estrutura urbana sofrerão o impacto da chegada de mais de 100 mil pessoas, atraídas pelas promessas de emprego, gerando conseqüências desastrosas nas áreas da habitação, saúde, educação e segurança.

O custo de Belo Monte se torna ainda mais proibitivo quando se sabe que, na fase de operação, a usina - cuja construção deverá custar R$ 30 bilhões - empregará apenas 700 funcionários e que a energia produzida a este preço exorbitante será destinada quase exclusivamente aos complexos Albrás-Alunorte da Vale, no Pará, e Alcoa, no Maranhão.

Para que tamanho descalabro possa seguir adiante, o governo federal e a Eletronorte organizaram apenas quatro audiências que nada tiveram de públicas com cerceamento, falta de transparência e, ainda por cima, a presença de tropas da Força de Segurança Nacional. Recentemente, as pressões do governo para obter a licença ambiental do Ibama à qualquer custo redundaram na demissão de dois diretores deste órgão.

Diante deste quadro aterrador, estamos aqui para dizer que nossa luta é pela vida e contra aqueles que querem nos impor a morte. Nossos protestos representam a defesa da Amazônia e de um modelo de desenvolvimento que garanta a preservação de nossa rica biodiversidade, e a sustentabilidade e dignidade do povo trabalhador. Nossa força vem de vozes antigas do poder popular. Nossos passos e nossas palavras vieram do fundo da história e nada nos deterá. Viemos aqui para dizer:

Águas para a Vida e não para Morte!

O Belo Monstro não passará!

Rio Xingu vivo para sempre!

Belém, 11 de Dezembro de 2009.


(Texto: Cleide Magalhães e Marquinho Mota, assessor de comunicação do Fórum da Amazônia Oriental - Faor
. Fotos: Cleide Magalhães.)

Um comentário:

Vânia Soares de Magalhães disse...

Todos os países precisam aproveitar suas fontes de energia, pois sem ela as sociedades modernas não vivem. Até para ler este blog e para levá-lo ao ar a energia é vital. Os computadores também são produzidos em indústrias, com peças plásticas e metálicas ... Não usar uma fonte de energia renovável como é a hidroeletricidade é deixar de dispor de um recurso natural livre. O Brasil tem muitos rios ... O interesse é nacional e faz parte de um projeto de integração regional sul-americana. Podemos idealizar a natureza (com suas cobras, aranhas, mosquitos, doenças tropicais ...) e pretender transformá-la em santuário, mas na realidade ela precisa ser aproveitada racionalmente. Preservacionismo é um mote dos anos 70 (não tocar em nada) - hoje se fala em conservacionismo (usar sem destruir). Os rios seguem seu curso após as barragens e se renovam. O Brasil não é um monte de segmentos estanques: tem que ser pensado como um todo. O que seria do país sem as usinas construídas ém décadas anteriores? Faltaria energia ou teríamos que fazer termoelétricas sujas.