Somente o não pagamento da dívida e a ruptura com a Troika e seu ajuste podem dar uma saída aos trabalhadores e à juventude
Nota da Unidade Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional
O triunfo da esquerda é um fato muito importante que impacta os trabalhadores e a juventude europeia, e também os povos do mundo que vêm lutando e enfrentando há décadas os ajustes e cortes de direitos promovidos pelos governos patronais – agentes do imperialismo e do Fundo Monetário Internacional (FMI). A vitória é ainda mais significativa quando muitos davam a esquerda por morta e em algumas eleições europeias crescia a extrema direita como Marine Le Pen e a Frente Nacional de França ou mesmo a formação neonazista grega Nova Democracia.
Grécia: um país saqueado pelo FMI e a dívida externa
Estas eleições legislativas para formar um novo governo ocorreram antecipadamente por causa da grande crise política e social que vive Grécia. Crise que vem aumentando ano a ano desde que seus governos vinham aplicando o ajuste e os cortes de direitos que pactuaram com a chamada Troika (União Europeia (EU), Banco Central Europeu (BCE) e o FMI), comandados por Angela Merkel e a os banqueiros internacionais. Estes, juntos às multinacionais, querem que sejam os trabalhadores que paguem as perdas geradas pela crise econômica mundial gerada pelos próprios capitalistas
Grécia é o ponto mais fraco das nações imperialistas europeias, unida à crise aguda de Espanha, Portugal e Itália. Desde muitos anos a Troika vem aplicando planos e planos de ajuste sobre o povo trabalhador e a juventude grega, com a mentira de que só desta forma os credores internacionais podem “ajudar” injetando bilhões na economia.
As consequências estão á vista: um país com 11 milhões de habitantes perdeu, desde 2009, um milhão de empregos. Foram fechadas 30% das empresas, o salário caiu em cerca de 38% e as aposentadorias e pensões em uns 45%. Ao mesmo tempo, mesmo com todos esses cortes para pagar a dívida, a mesma chegou a 175% do Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, quanto mais se paga, mais se deve.
No entanto, a classe trabalhadora e a juventude não ficaram de braços cruzados. Eles vêm resistindo a estes planos de miséria com cerca de 20 greves gerais, greves parciais, por categorias e mobilizações de todo o tipo. Desta forma vem dificultando os planos da Troika e dos governos cúmplices, aumentando a instabilidades política e a crise do regime político.
O triunfo do Syriza mostra que as massas se radicalizam e buscam uma mudança à esquerda
O voto massivo em Syriza mostra que ocorreu um giro eleitoral à esquerda das massas. Temos que ter em conta, também, que este mesmo partido conseguia somente cerca de 4,5% dos votos há alguns anos. Nas últimas eleições, cresceu para 16% e depois logo para 26%, tudo isso ao compasso da aplicação do ajuste, o desprestígio dos velhos partidos e as fortes lutas operárias e populares.
A Syriza tem sua origem na corrente de esquerda Synaspismos, que é essencialmente formada por militantes que abandonaram o Partido Comunista Grego (KKE) numa ruptura de 1991. Muitos assumiram postura reformistas do chamado “eurocomunismo”, e foram se aliando a outros setores e grupos da esquerda grega.
Esta votação expressa a ruptura política de milhões com os velhos políticos e partidos que ajustaram e pactuaram o Memorando (acordo de medidas de austeridade) com a Troika. Por isso a esquerda reformista grega, organizada no PASOK (Partido Socialista Grego, socialdemocrata), que governou por muito tempo com Papandreu (ex-primeiro ministro), nas eleições do domingo (25) teve somente 4,6% dos votos.
A maior parte da base eleitoral do PASOK eram os trabalhadores, os setores populares e a juventude. Papandreu, que rompeu com seu antigo partido e fundou o Movimento Socialista Democrático, chegou somente a 2,4% e acabou fora do parlamento. Os neonazistas do Nova Democracia conseguiram 6,28%, elegendo 17 deputados. O KKE (PC Grego que segue se considerando estalinista) chegou a 5,4%, com 15 deputados.
A Syriza tem sua origem na corrente de esquerda Synaspismos, que é essencialmente formada por militantes que abandonaram o Partido Comunista Grego (KKE) numa ruptura de 1991. Muitos assumiram postura reformistas do chamado “eurocomunismo”, e foram se aliando a outros setores e grupos da esquerda grega.
Os mais de dois milhões de votos conquistados pela Syriza expressam essa bronca com os governos e a Troika, e também a busca de mudanças de fundo, à esquerda, de ruptura com as políticas de ajuste. Neste sentido, o voto na esquerda é um duro chamado de atenção e causa medo no imperialismo e na Troika, que temem que o efeito Syriza se repita em outros países da Europa e mundo.
Sem ruptura com a Troika, a UE e com o pagamento da dívida não haverá solução para os problemas dos trabalhadores e da juventude grega.
O triunfo eleitoral da esquerda e a instalação de um governo encabeçado por Alexis Tsipras abrem uma nova etapa política em Grécia. Milhões de trabalhadores e jovens têm grandes esperanças e expectativas de mudanças. Milhões de trabalhadores em Europa e no mundo também estão esperançosos. Inclusive em Espanha vão ocorrer eleições municipais em maio e há uma expectativa similar com o novo partido Podemos que, segundo várias pesquisas, pode derrotar o PP (direita conservadora) de Rajoy e ao PSOE (socialdemocracia espanhola), ambos aplicadores dos planos de ajuste contra o povo espanhol.
Nós, socialistas revolucionários da Unidade Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI), respeitamos as lógicas expectativas dos trabalhadores e jovens gregos e que estes vejam o Syriza como seu governo. Porém, desde já alertamos que os trabalhadores não podem dar nenhum cheque em branco ao novo governo.
O povo trabalhador grego deve seguir confiando em sua mobilização para impor as mudanças que aspiram, para assim poder acabar com os ajustes e conseguir mudar a situação. Nós somos categóricos em sustentar que a única via para iniciar as mudanças necessárias para melhorar a vida do povo grego passa por um plano de emergência que anule o Memorando da Troika, avance com o não pagamento da dívida de forma imediata e chegue até a ruptura com a Troika, a zona do euro e a União Europeia. Não há espaço para meias medidas. A dívida e os acordos com a EU são a principal causa do drama da Grécia. Se não se começa com medidas de ruptura, não terá solução para resolver os problemas de fundo do povo grego.
Neste sentido não podemos deixar assinalar que esse não deve ser o caminho que vai assumir o novo governo da Syriza. Tsipras se comprometeu a terminar com os ajustes e aumentar os salários, mas em vez de suspender já o pagamento da dívida, ele e alguns dirigentes do Syriza falam, por exemplo, em uma “renegociação” para seguir pagando a ilegítima dívida em melhores condições.
Alex Tsipras declarou ao diário alemão Handelsblatt, no final de dezembro de 2014, que “um governo liderado por Syriza respeitará todas as obrigações que a Grécia assumiu em quanto membro efetivo da zona do euro, buscando alcançar um equilíbrio orçamentário e procurando atender aos objetivos fiscais no âmbito da União Europeia”.
Depois disso, em 20 de janeiro, reafirmou ao jornal britânico Financial Times. “Um futuro governo liderado por Syriza vai manter todos os compromissos que Grécia assumiu anteriormente com a União Europeia em matéria orçamentária, para eliminar o déficit fiscal”. Também, lamentavelmente, Syriza já deixou de lado sua proposta de 2012 de renacionalizar as empresas privatizadas. “A renacionalização será impossível devido à falta de liquidez do Estado”, disse Yannis Varoufakis, ministro de finanças do governo de Tsipras.
Muitos companheiros que têm expectativas em Syriza podem dizer que exageramos, que temos que dar um tempo ao novo governo, ou que estas declarações que citamos são táticas. Não queremos ser estraga-prazeres. Só dizemos que já houve outros governos onde se deram as mesmas propostas e argumentos. Nestas experiências, quando alertávamos, acusavam-nos de “ultraesquerdistas” e “apressados”. No entanto, lamentavelmente, fracassaram esses projetos de conciliação e busca de pactos com os setores patronais.
Agora Syriza faz um acordo com um pequeno partido de direita (Gregos Independentes) que terminou as eleições do domingo (25) em sexto lugar, para poder formar um governo. Já temos experiências dos governos latino-americanos que iniciaram com os mesmos argumentos que hoje fazem o Syriza.
Os casos de Lula e o governo de “esquerda” do PT, de Evo Morales do MAS de Bolívia ou o do chavismo em Venezuela. Nestes países não se tomaram medidas de fundo anticapitalistas e, no caso de Lula-PT, diretamente houve um acordo com o FMI, e os trabalhadores viram perdidas suas expectativas de mudança.
Em Venezuela, onde o chavismo chegou ao poder há 15 anos com grandes expectativas, o país se atola na crise, no desabastecimento de produtos alimentares, demissões de trabalhadores e na inflação mais elevada da América Latina. Por isso, ratificamos que segue colocada a necessidade de que a classe trabalhadora seja independente destes governos e seja protagonista com sua luta, com seus próprios organismos, com suas assembleias, para ajudar a formar uma nova direção socialista revolucionárias nestes processos.
Neste caminho chamamos os trabalhadores gregos, a juventude e a base do Syriza, os seus setores mais combativos, que exijam, com sua mobilização, ao governo de Tsipras e Syriza que assuma a ruptura com o modelo econômico atual, baseado no endividamento e saque dos recursos da classe trabalhadora; que rompa com a Troika e a EU e que deixe pagar a dívida. Propomos também que se elabore uma plano de emergência que inclua medidas de fundo para sair da crise, como a nacionalização dos bancos e a reestatização de todas as empresas e propriedades privatizadas. Daí sairá o dinheiro para dar salários e aposentadorias e pensões justas, trabalho, saúde e educação para o povo trabalhador grego.
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Fonte: Corrente Socialista dos Trabalhadores/PSOL, seção da Unidade Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional (UIT-QI) no Brasil - 27 de janeiro de 2015.
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