quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Não era história de pescador


O Lord Byron existe, assim como o Peter Pan, Príncipe Aladin e tantos outros iates regionais, que em Ponta de Pedras, no Arquipélago do Marajó, têm esses nomes interessantes. Quem haveria de pensar que um caboclo marajoara, gente das ilhas, poderia conhecer Lord Byron?
Oras se não! Dessas bandas já saiu caudalosa poesia das artes.
Chama atenção como pronunciam o nome do barco. Simples como se lê: Lord Birôn.

Foi a vez que fomos fazer campanha de prevenção e combate ao escalpelamento e hepatites virais nesse município, depois de ter passado por Muaná, São Sebastião da Boa Vista, Curralinho, Breves, não necessariamente nesta ordem. O fato é que, campanha encerrada, precisávamos voltar pra casa.

Só que não é todo dia que tem barco ou navio de linha que faz Belém x Ponta de Pedras x Belém. E agora? Tem que haver uma saída, pensei.
Saí com um casal de colegas do trabalho a perguntar pelas alternativas.
Não é possível que a gente esteja literalmente ilhado.
A maioria das pessoas deram uma luz. Ufaa! Brilho nos olhos. Viva! Tem uma alternativa...

O Peter, o Lord, outros nomes que não recordo. Barcos que transportam todos os dias centenas e centenas de paneiros de açaí dessa reigião para a Feira do Açaí do Complexo do Ver-O-Peso em Belém.
Problema! Aaaah... Tinha que convencer uma dessas embarcações a ti permitir viajar.

Ou não tinham visto para tal ou estavam, geralmente, com a lotação completa. Bastava vir uns parentes, que já era. Parecia que teríamos mesmo que ficar mais um dia no querido Marajó. Pra quem lê assim, parece até frescura, mas não é pra quem já está fora do seu aconchego por cerca de 30 dias.

Amo passear. Mas passeio é diferente de trabalho. No trabalho você até se diverte. Mas nunca relaxa. Por isso nada melhor do que chegar na tua cama, colo de família, amigos, luta de classes. Relaxar.
Mas eis que perdido um iate, dado de cara na negativa em outros dois, um quarto aceitou cobrar e nos levar de volta para casa. Uhuuu!!!

Mais duas paradas para mais açaí. Furos lindos, que desembocam no rio principal que banha a cidade. Enfim Baía. Tem uma estátua fincada nas pedras. Muitas pontas. Expostas. Ponta de Pedras. Lugar de água, terra, bicho, vegetal e gente. De quem sabe que navegar é preciso. Realmente a baía não é pra qualquer um. Este povo resiste a tudo.

Foi aí que mil e quinhentas pessoas, segundo o repórter Carlos Mendes em matéria para a Agência Estado dia 12 de setembro de 1999, tacaram fogo no prédio da prefeitura e da câmara municipal. Tudo porque a população se revoltou com o prefeito, José de Nazaré Chiappetta (na época PFL, atual DEM). Foi notícia nacional a inédita cassação de um título de médico pelo Conselho Regional de Medicina no Pará. Além de ser acusado de desviar mais de R$ 2 Milhões dos cofres municipais, pesava contra ele sua ausência constante do município e o grave fato ser preso, após investigação do Ministério Público do Estado, pelo crime de deixar centenas de mulheres estéreis. Mais desgraçadamente ainda: troca de votos. Fazia laqueadura de trompas e abortos clandestinos em um açougue de sua propriedade em Belém, que a imprensa e o próprio chamavam de clínica.

Mas isso é outra História. Falávamos do encantamento, alegria, medo, sabor e desabor que é precisar navegar por essa magnífica região de campos e várzea do Marajó.

Quando chegamos no barco, chamou atenção uma máquina de bater açaí. Firme. Quem não gosta?! Quando vi toda aquela amarração nela, tive noção do que nos aguardava. Maresia. E a baía do rio Pará ou do Marajó, que em Abaetetuba ganha outro nome, tem hora do dia que está muito agitada. Não deu em outra. Haja maresia... Vento... Água espirrando de todos os lados... Olhei lá pra dentro, meus colegas estavam deitados em uns bancos de madeira. O banzeiro dá esses enjoos em quem não tem costume. É como aqueles brinquedos do Centro Ita. Só que num balanço de três, quatro longas horas... Depende da maré. Do vento. Maresia.

Por incrível que pareça, o gingado foi maior ainda. Outra baía. A do Guajará. Eu gosto.
Já se via as luzes da cidade. Por volta de sete e pouco da noite atracamos na Feira.

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