domingo, 5 de fevereiro de 2017

Globalização de muros

Vamos falar sobre as barreiras do capital, do colonialismo e da xenofobia? É urgente!

Imagem: site Viva a Palestina
por Tailson Silva*

O nosso mundo atual, em que pese o discurso político dos ideólogos do capitalismo e da globalização, está recheado de barreiras que afetam de formas distintas os povos do mundo, mas que tem no projeto de acumulação capitalista o seu principal motor de desenvolvimento. Não tem como discutir o mundo atual sem traçar alguns paralelos sobre o processo de globalização e seus respectivos reflexos em nossa sociedade global.

A globalização é um dos processos de aprofundamento internacional da integração econômica, social, cultural e política, impulsionado em grande parte pela revolução industrial que aprofundou o avanço da técnica, reduzindo custos e modernizando os meios de transporte e comunicação dos países. O Fundo Monetário Internacional identifica quatro aspectos básicos da globalização: comércio e transações financeiras, movimentos de capital e de investimento, migração e movimento de pessoas e a disseminação de conhecimento. É notório que a globalização provocou a diminuição de fronteiras e barreiras para a circulação de mercadorias, capitais e informações, mas será que o mesmo ocorreu para a circulação dos seres humanos?

Outro elemento de contradição da globalização é a inclusão desigual em que os povos dos países subdesenvolvidos estão inseridas dentro do atual mercado capitalista mundial. Onde devido aos anos de saque das riquezas a partir do colonialismo europeu na América, Ásia, África e Oceania, e também de acordo com a atual divisão mundial do trabalho, os países desenvolvidos estabeleceram as primeiras barreiras aos povos do mundo subdesenvolvido: a barreira econômica! Onde segundo o geografo Milton Santos, produziram-se os espaços do mandar e do fazer.

Se não fossem só as barreiras econômicas, ainda existem as barreiras físicas espalhadas pelo planeta. Eduardo Galeano em 2006, escreveu o texto “Muros” descrito na integra abaixo:
“Muro de Berlim era a notícia de cada dia. Da manhã à noite líamos, víamos, escutávamos: o Muro da Vergonha, o Muro da Infâmia, a Cortina de Ferro... Por fim, esse muro, que merecia cair, caiu. Mas outros muros brotaram, continuam a brotar, no mundo, e ainda que sejam bem maiores que o de Berlim, deles fala-se pouco ou nada.
Pouco se fala do muro que os Estados Unidos estão a alçar na fronteira mexicana, e pouco se fala do arame farpado de Ceuta e Melilla. Quase nada se fala do Muro da Cisjordânia, que perpetua a ocupação israelita de terras palestinianas e daqui a pouco será quinze vezes mais longo do que o Muro de Berlim. E nada, nada de nada, se fala do Muro de Marrocos, que desde há vinte anos perpetua a ocupação marroquina do Saara ocidental. Este muro, minado de ponta a ponta e de ponta a ponta vigiado por milhares de soldados, mede sessenta vezes mais que o Muro de Berlim. Por que será que há muros tão altissonantes e muros tão mudos? Será devido aos muros da incomunicação, que os grandes meios de comunicação constroem em cada dia?”

O que Galeano escreveu há 11 anos é de uma atualidade impressionante. Há muitos muros do capital pelo mundo e que hoje não se falam nos meios de comunicação por se chocar com a ordem do capital vigente. Muitos na época em que escreveu este texto e o que talvez Galeano não imaginava é que hoje em dia não só esses mesmos muros ainda existem, como muitos outros surgiram ou se ampliaram.

Atualmente o mundo está cercado de muros, bloqueios econômicos, cercas e leis anti-imigração, tais quais as cercas na Europa (Hungria, Sérvia, Eslovênia e Áustria) para impedir a entrada de refugiados; o muro na fronteira dos Estados Unidos com o México para impedir a entrada de imigrantes latinos; os muros da colonização sionista na Palestina histórica; entre tantos muros no mundo, como nas cidades de Ceuta e Melilla na Espanha, no Marrocos, na fronteira da Arábia Saudita com o Iraque, na fronteira da Índia com Bangladesh e outros.

Talvez os muros mais simbólicos atualmente são os muros do apartheid e da colonização sionista na Palestina: 230 km na fronteira com o Egito; na fronteira com a Síria na altura das Colinas de Golã; na Cisjordânia, totalizando 760 km que separam o Estado de Israel da Cisjordânia, separam também a parte Ocidental de Jerusalém da parte Oriental, assim como separa as colônias sionistas dos territórios palestinos dentro da Cisjordânia e o muro de 30 km na fronteira com a Jordânia. Que servem para separar os colonos sionistas do povo palestino, ao passo que também servem para usurpar as terras dos palestinos. Tudo isso a serviço da total colonização sionista da Palestina.

Mas, não é só de muros e cercas que o capitalismo vive. Ainda há os bloqueios econômicos impostos por países imperialistas e colonialistas, como no caso de Cuba e Irã, assim como o nefasto bloqueio econômico de Israel a Faixa de Gaza. Bloqueio que é um método usado pelo sionismo contra a resistência Palestina e que em 2013 segundo dados da OCHA (Escritório das Nações Unidas para Assuntos Humanitários) atingia cerca 1,7 milhões pessoas e destruiu cerca de 120 mil empregos. Onde cerca de 300 mil palestinos da Faixa de Gaza (Um quinto da População da área) viviam com cerca de US$ 1 por dia (Dólar). Segundo a ONU, o bloqueio a Faixa de Gaza provocou o empobrecimento ainda maior, da população palestina da área, assim como a escassez de alimentos, água, energia, medicamentos, materiais de construção (fundamentais para reconstrução da região) e combustíveis que são constantemente impedidos de entrar em Gaza sem autorização de Israel. A situação de Gaza após os bombardeios de 2014 tornou-se ainda muito mais dramática.

Se não bastassem muros, cercas, bloqueios ainda tem as leis xenófobas e anti-imigração como o decreto de Trump que prevê a suspensão total, durante 120 dias, do programa de admissão de refugiados, assim como o congelamento, por três meses, da entrada no país de pessoas provenientes de sete países muçulmanos: Iraque, Irã, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iêmen. Ou os planos de acolhimento de refugiados da União Europeia, que limitaram em 2015 a apenas 120 mil o número refugiados a serem acolhidos, que deveriam ser divididos entre os países membros, meta que sequer foi cumprida pelos arautos das ideias de “liberdade de locomoção” dos seres humanos.

Barreiras econômicas, muros, cercas, bloqueios e leis xenófobas e anti-imigração: Quando as barreiras do capitalismo não são econômicas, elas são físicas. E nossa resposta dever ser a derrubada de todos esses governos e barreiras a serviço do capital e contra os povos do mundo.
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Tailson Silva é professor de Geografia da rede pública, militante da CST/PSOL e colunista do Além da Frase.

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