domingo, 18 de fevereiro de 2018
A esquerda brasileira no labirinto do PT
Adolfo Santos e Diego Vitello – Dirigentes nacionais da CST-PSOL
O julgamento do ex-presidente Lula tem enfiado amplos setores da esquerda num verdadeiro labirinto. Prisioneiros da propaganda do lulopetismo e seus aliados, estes grupos políticos se perdem em justificativas, explicações, acusações e propostas estapafúrdias. Nenhuma delas conduz ao caminho para superar uma direção que traiu os interesses da classe trabalhadora, quando é imperioso construir uma saída frente a uma das maiores crises política, econômica e social da história recente do Brasil. Escrevemos este texto para aportar ao debate apresentado pelo PT e pela maioria das correntes do PSOL em defesa de Lula e contra sua condenação por fatos relacionados com a corrupção.
Nestes dias assistimos fatos concretos que ajudam a compreender melhor esta discussão. As mobilizações convocadas em apoio de Lula demonstraram mais indiferença que interesse por parte da população trabalhadora em relação ao processo do julgamento. Os atos do dia 23/01 em Porto Alegre e 24/01 em São Paulo, onde o PT, a CUT, a CTB e o MTST jogaram toda a força de seus aparatos, não moveram nenhuma parcela expressiva da classe trabalhadora, que não compactua com a corrupção desenfreada deste regime em decomposição. No ato não estiveram presentes os batalhões pesados do operariado com fortes colunas de metalúrgicos, bancários, carteiros, petroleiros ou trabalhadores do transporte. Pelo contrário, a maioria dos atos era composta de militantes de organizações que se alinha
ram ao campo lulista.
Felizmente, algumas organizações da esquerda, dirigentes políticos e sindicais e principalmente importantes setores da base da classe trabalhadora e também do próprio PSOL, de diferentes categorias e da juventude, resistem à lógica do “mal menor” e às mais diversas acusações, por não nos alinharmos com a defesa de Lula e seu projeto. São muitas as opiniões que circulam em documentos, jornais e nas redes que manifestam a rejeição a defender a principal figura do PT das acusações de corrupção. Como parte desses setores, que não aceitam livrar a cara dos que se integraram a este regime podre, a CST publicou vários artigos, colocando claramente que os crimes de corrupção devem ser investigados, os culpados punidos e seus bens confiscados. Lula e a direção histórica do PT são parte desses esquemas de propinas, desvios de dinheiro público e enriquecimento ilícito. Por isso entendemos que não é tarefa da esquerda consequente a defesa de Lula, nem de outros tantos envolvidos em corrupção.
Pois disso se trata. O ex-presidente Lula não está sendo acusado nem julgado por perseguição política, por apoiar a ocupação de terras, por desapropriar prédios e entregar-los aos sem teto, por romper com o sistema financeiro, por confiscar os bens dos empresários que inflacionam os preços ou que sonegam impostos ou por desobediência civil. Em qualquer caso de uma condenação dessas, a CST estaria de forma incondicional na defesa de Lula ou de qualquer outro. Mas infelizmente, não se trata disso. Lula, à cabeça de seu partido, integrou-se ao regime burguês decadente que governa nosso país. Seguiu os passos dos governos que o antecederam e que sempre denunciamos, e integrou-se aos esquemas de corrupção.
“A opção de Lula e da cúpula petista de aderir ao projeto de submissão imperialista, converteu as velhas lideranças de esquerda em capachos do sistema financeiro, do agronegócio e das multinacionais e levou inevitavelmente a utilizar os mesmos esquemas e os mesmos métodos corruptos dos governos e regimes anteriores […] O PT e a maioria de seus dirigentes e parlamentares financiaram suas campanhas graças às contribuições de madeireiros, bicheiros, multinacionais e banqueiros… Cabia-lhes, depois pagar a conta, lembrando o velho ditado que diz: quem paga a banda, escolhe a música”Do artigo: “Corrupção e neoliberalismo”, publicado pelo mandato do deputado federal Babá, PSOL/RJ, em agosto de 2005.
Lula e o PT são parte do processo de corrupção sistêmica no Brasil
É consenso entre a maioria das organizações de esquerda que no Brasil existe um processo de corrupção sistêmica. Grosso modo, o sistema político para os maiores partidos (PMDB, PT, PSDB, PP, etc.) funciona assim: as grandes empresas, como é o caso da Odebrecht, OAS, JBS, Itau e outras, financiam campanhas políticas milionárias, de candidatos de diferentes legendas. Terminado o pleito, os vencedores, através do executivo e do legislativo, passam a defender os projetos de interesse dessas empresas, seja com projetos de lei, concessão de obras e serviços públicos. As empreiteiras, umas das que mais financiam as campanhas, são favorecidas com obras superfaturadas, que lhes permitem altíssimos lucros e um generoso excedente para destinar ao financiamento dos partidos e políticos de forma individual. As obras da Copa 2014 e das Olimpíadas 2016 foram uma verdadeira farra com o dinheiro público que beneficiou empresários e políticos, Sérgio Cabral, que sempre foi aliado de Lula, é o melhor exemplo disso. Se pesquisarmos o financiamento eleitoral do PT, do PMDB, ou do PSDB, veremos que esses partidos e seus dirigentes, se beneficiaram fartamente dos dinheiros das empreiteiras. Os que defendem Lula, e portanto negam que esteja envolvido nos esquemas de corrupção, entendem que o PT e seus dirigentes não são parte da corrupção sistêmica em nosso país?
Além disso, sob pretexto da “governabilidade”, e a troca de apoio aos seus projetos, o partido no governo, distribui cargos para seus “aliados” que passam a controlar pequenos “feudos”, como ministérios, secretarias, direção de estatais, desde as quais comandam fortes esquemas de desvio de dinheiro. É só lembrar as fotos do apartamento alugado para guardar malas, caixas e pacotes desbordando dinheiro desviado por Geddel Vieira Lima, queridinho nos governos de Lula, Dilma e Temer, onde ocupou importantes cargos. Escândalos de corrupção como Mensalão, Petrolão e o Trensalão do tucanato de São Paulo, se enquadram nesse tipo de corrupção, que é o mais comum. O PT não foi o inventor destes esquemas, mas os adotou e os expandiu.
Será que as confissões de Marcelo e Emilio Odebrecht, que sujam ainda mais seu nome e o de sua empresa, uma das maiores empreiteiras, são somente para conspirar contra Lula e prejudicá-lo? A formação de um exclusivo“departamento de propina”é uma invenção dos diretores da Odebrecht para condenar Lula, ou é a maior prova da existência de uma corrupção sistêmica no país da qual o PT foi partícipe? A aceitação de devolver bilhões aos cofres públicos por parte de estas empresas é um surto de arrependimento ou é o custo calculado por essas empresas ao se enfiar até o pescoço na corrupção? As delações de Palocci, braço direito de Lula durante seus governos e principal articulador da sua política econômica neoliberal, é apenas uma montagem contra o “inocente” Lula e um suicídio político/moral do ex-ministro de economia? Palocci, que conviveu por anos ao lado de Lula era um corrupto e Lula não sabia? Acreditamos que não, que são provas incontestáveis da existência de um regime corrupto, do qual Lula e o PT também são parte. Lamentavelmente, há setores de esquerda que acham que tudo isso não passa de uma armação para impedir Lula de ser candidato.
A comprovação de que o PT é parte da corrupção sistêmica do capitalismo brasileiro já desmonta o argumento utilizado pelo petismo e pelos grupos que optaram por serem seus satélites na defesa do ex-presidente, de que “não há provas contra Lula”. Mas obviamente existem muitas mais evidências. Boa parte do antigo alto escalão petista desviou dinheiro público para diferentes interesses, incluídos os pessoais. Dirceu, Palocci, Delúbio Soares, Silvinho “Landrover” Pereira, José Genuíno, João Vaccari Neto, João Paulo Cunha, foram presos por corrupção fartamente testemunhada e documentada. Todos foram durante anos da equipe de confiança e do círculo íntimo de Lula. É possível que o presidente, com toda sua experiência, que sempre comandou com “mão de ferro” o PT, não soubesse que estes personagens estivessem fazendo o que fizeram? Obviamente que não.
Além disso, é possível que Lula, que recebia da Odebrecht altíssimas quantias de dinheiro para fazer “palestras” pelo mundo e interceder em favor dessa empresa em Cuba, Venezuela, Argentina, Peru, Equador, países onde hoje também se investigam graves denúncias contra a empreiteira e há até ex-presidentes presos como em Peru, “nem sonhasse” que a empresa, onde seus altos executivos confessaram que mantinham pagamento de propina a políticos desde a ditadura, tivesse envolvimento com corrupção? Obviamente que sabia. Fora isso, as planilhas da Odebrecht com repasses a Lula, além da confissão de Leo Pinheiro, amigo de Lula e pagador da propina pela OAS, também são provas concretas, ou a Odebrecht, a OAS, e outras empresas, também querem se suicidar?
O argumento de que “não há prova contra Lula”, levantado não somente pelo PT, mas também por correntes do próprio PSOL é lamentável e não condiz com a realidade. É um argumento que traz consigo ou uma grande inocência ou uma enorme capitulação política, pois visa “livrar a cara” de Lula e do PT serem parte da corrupção no Brasil. Mais lamentável ainda quando desde 2005, com o escândalo do mensalão, a esquerda consequente tinha um claro entendimento e denunciava que o PT chafurdava na lama junto aos demais partidos da ordem.“Os esforços das “elites”, da cúpula do PT e das lideranças do movimento para blindar o presidente Lula e o Ministro Palocci da crise que vai devorando a cada dia o Partido dos Trabalhadores, foram vãos […] O argumento que “Lula nada sabia” torna-se, a cada dia, mais insustentável e até ridículo: o caixa dois e /ou o mensalão, eram para comprar partidos e parlamentares do PT e da base aliada do governo Lula; para obter maioria no Parlamento e para votar os projetos decididos pelo governo Lula…” Trecho de um artigo publicado pelo mandato do deputado federal Babá, PSOL/RJ em agosto de 2005 sob o título: A ética de chiqueiro, está levando o PT e o governo Lula ao túmulo.
A condenação de Lula coloca em risco a “democracia”?
Outro dos argumentos bastante utilizados pelos defensores de Lula, é que a sua condenação coloca em risco a democracia e poderia significar um recorte dos direitos democráticos para a classe trabalhadora. Temos que responder isso concretamente. De quais direitos democráticos os companheiros falam? A condenação de Lula restringirá as liberdades do movimento sindical? As greves podem ser proibidas em breve? A liberdade de reunião e de assembleia será logo considerada ilegal? Os partidos que fizeram oposição de esquerda ao PT (PSOL, PSTU, PCB), terão seus candidatos cassados? Teremos um salto qualitativo nas prisões de dirigentes sindicais, do movimento estudantil ou popular? A polícia vai passar a reprimir ainda mais nas periferias? Enfim, são perguntas que exigem respostas daqueles que agitam aos quatro ventos que a condenação de Lula atingirá a esquerda e à maioria da população brasileira. Não vemos que nada disso vai dar um salto qualitativo a partir da condenação de Lula. As liberdades democráticas continuarão com as limitações da democracia burguesa. A democracia burguesa, não é um direito universal, é a democracia dos ricos, por isso sempre as liberdades democráticas estão ameaçadas de serem cortadas, como é próprio do regime burguês repressor que impera em nosso país. Em determinados momentos se restringem, em outros se ampliam, dependendo da mobilização.
As liberdades democráticas sofreram ataques também durante o governo do PT. Grande parte das restrições democráticas, que foram impostas à esquerda e os trabalhadores, foram apoiadas pelo próprio PT! Assim como na era Lula/Dilma, veremos processos e detenções de ativistas em manifestações. O povo da periferia seguirá sendo vítima da barbárie policial, o que já existia na era petista. É bom relembrar que graças à Lei de Drogas, de 2006, imposta pelo Governo Lula, durante os 13 anos de governo petista, a população carcerária (em sua maioria composta por jovens pobres e negros), dobrou no país. As greves continuaram sendo declaradas ilegais, sofrendo interditos proibitórios e pesadas multas aos sindicatos, assim como nos governos petistas. Ou seja, a condenação de Lula não altera as poucas liberdades democráticas alcançadas até o momento para a classe trabalhadora e o povo pobre. Não há uma mudança de regime a partir da condenação de Lula. Infelizmente, grande parte das organizações da esquerda brasileira está agitando esse fantasma para ajudar o PT a transformar Lula numa vítima, em um símbolo das liberdades democráticas para a nossa classe. Logo ele e o seu partido, que atentaram várias vezes contra ela!
Na verdade, quem mais teme depois da condenação de Lula são os próprios políticos corruptos. Não podemos aceitar que há que defender Lula, porque Temer, Aécio, José Serra, Renán ou Romero Jucá estão soltos. Com esse argumento deveriam exigir a liberdade de Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, Eduardo Azeredo, Palocci, Geddel Vieira Lima e tantos outros e que tenham seus direitos reintegrados, porque Aécio e Temer estão em liberdade. Esse argumento não passa de uma conveniência momentânea, e só servirá para defender Lula, ninguém mais. Por que não defendem a liberdade de Dirceu, Palocci ou João Vaccari Neto? Porque mais uma vez se trata de uma capitulação política, onde os argumentos são jogados para justificar a defesa de que Lula é “diferente” dos outros. De nossa parte defendemos investigação e punição de todos os corruptos.
Alguns ainda ousam comparar os casos de Lula e Rafael Braga, como foi o caso da Deputada Maria do Rosário (PT-RS). Debatendo sobre os direitos democráticos e a estúpida comparação entre os casos Rafael Braga e Lula, Cecília Oliveira, colunista do site www.theintercept.com coloca: “Este paralelo fica ainda mais raso quando você lembra que a vida de jovens negros e pobres como Rafael foram impactadas severamente por situações específicas onde o PT é algoz, não aliado. Lei de Drogas é uma delas. Instituída em 2006 durante o governo petista, foi fator chave para o drástico aumento da população carcerária no Brasil, especialmente contra jovens negros e pobres, como Rafael. Foi também na gestão petista que houve um recrudescimento penal que nos deixou como legado a Lei de Organizações Criminosas, a Lei Antiterrorismo e a indicação de ministros nem sempre ligados ao campo jurídico progressista para o Supremo Tribunal Federal e de Justiça. E temos ainda a gestão penitenciária precária e a criação da Força Nacional de Segurança. ” Rafael Braga é um símbolo da luta pelas liberdades democráticas, sobretudo para os pobres e negros. Lula, não!
Essas posturas banalizam a luta pelas liberdades democráticas e levam confusão às fileiras da esquerda. A possibilidade de Lula concorrer ou não na próxima eleição não está relacionada com a restrição das liberdades democráticas, nem com a perseguição do petista, mas com fatos de corrupção. Tanto é assim que uma importante parte do regime democrático burguês, que compõe a “ordem” neste país, lamenta essa situação. O “golpista” Temer e Henrique Meirelles, as duas principais figuras deste governo, ao lado de Renan Calheiros, cacique do governante PMDB, Eunício de Oliveira, o bandido que preside o senado, Fernando Henrique Cardoso, chefe tucano, e tantas outras figuras deste regime podre, se manifestaram lamentando que Lula possa ser impedido de participar no pleito eleitoral de 2018 e não desejam que o PT desapareça porque a pesar da perda de prestigio, ainda lhes pode servir como uma ferramenta de controle das massas como se demonstrou durante anos.
Nenhuma confiança no sistema judiciário
Como colocamos em recente nota: “Não podemos depositar nenhuma confiança na justiça burguesa que integra o acordão que deixa impune Michel Temer e seus ministros, Aécio Neves e José Serra, os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Eunício de Oliveira, ex-presidentes como Sarney e FHC, os chefes do quadrilhão do PMDB/PSDB. (…). Todos deveriam ser condenados por corrupção, perder seus cargos e ter seus bens confiscados. A justiça burguesa nunca é imparcial. O juiz Sergio Moro e a operação Lava Jato, por exemplo, colocaram sob sigilo a lista da Odebrecht em 2016, ajudaram Temer vetando perguntas formuladas por Eduardo Cunha e agora se compadece com um bandido como Sergio Cabral. Para ver uma efetiva punição de todos os corruptos, sem seletividade, é preciso ocupar as ruas, lutando contra a retirada de direitos e a reforma da previdência. (…) Retomar nas ruas o Fora Temer e todos os corruptos, contra todos os envolvidos em esquemas ilícitos: PMDB, PSDB, DEM, PT, (…) exigir a divulgação de todos os áudios e de todos os sigilos dos envolvidos na Lava Jato, a prisão e confisco dos bens de todos os políticos e empresários corruptos, a estatização das empresas envolvidas na Lava Jato, bem como a revogação de todas as medidas contra o povo, votadas durante a vigência do mensalão e da lava jato, como a reforma da previdência de 2003, as MP’s 664 e 665 de 2016, a PEC 55 de 2016, a terceirização e a reforma trabalhista de Temer. (Sobre a condenação em segunda instância do ex-presidente Lula. Corrente Socialista dos Trabalhadores, 25 de janeiro de 2018.)”
Ou seja, a nossa posição não é a de organizar mobilizações e a defesa de nosso “corrupto de estimação” (como faz grande parte da esquerda brasileira), mas de lutar para desvendar o gigantesco esquema montado pelos sucessivos governos, punir os responsáveis e confiscar seus bens. É errado abandonar esta luta porque o judiciário é uma instituição burguesa e portanto completamente parcial. Existem sim elementos de seletividade e temos que denunciar. O estranho é que essa seletividade não tenha sido denunciada quando o TSE julgou a chapa Dilma/Temer e a inocentou claramente por razões políticas, para não desestabilizar o governo e o regime. O que fez o PT, a CUT e seus aliados? Nada! Porque salvava Dilma de ter seus direitos casados e impedia a queda do governo Temer levando o processo às eleições de 2018, algo que interessava ao PT. Temos que denunciar a seletividade, não para salvar Lula, mas para exigir que a investigação se estenda a todo o arco de políticos notadamente corruptos.
Alguns debates com os companheiros do MAIS
Não é a primeira vez que temos diferenças com as posições do MAIS. Já discordamos de sua política de defesa da Venezuela de Maduro onde impera um regime ditatorial que, aí sim, reprime com bandas para-governamentais e corta fortemente as liberdades democráticas. Agora, em nome das liberdades democráticas, o MAIS se converteu num dos mais destacados defensores dos direitos de Lula, ainda que para isso tenham que distorcer as posições de outras correntes.
O dirigente do MAIS, Gibran Jordão, em recente artigo, faz uma ferrenha critica à nossa postura frente ao julgamento de Lula. Nos acusa de ultra esquerdistas e sectários e reafirma a posição de sua corrente: a defesa de Lula é um dever, uma tarefa fundamental da esquerda para evitar a perda de mais direitos e o advento do semi-fascismo. Para confirmar nosso suposto erro e tentar demonstrar contradições, Gibran provoca:“… Nesse raciocínio pobre de dialética, não seria coerente que os camaradas (da CST) fizessem uma autocrítica de suas posições na Argentina? Em dezembro do ano passado a corrente irmã da CST na Argentina publicou uma nota defendendo os direitos democráticos de Cristina Kirchner e outros dirigentes kirchnerista contra ações do poder judiciário daquele país…. Estariam os camaradas da CST/UIT capitulando ao Kirchnerismo na Argentina? Nós pensamos que não, tiveram uma posição correta em defesa de liberdades democráticas sem prestar apoio aos Kirchneristas. O que está completamente equivocado é a postura ultra esquerdista dos camaradas da CST no Brasil em relação ao julgamento de Lula. ” Numa manobra condenável e pouco honesta, Gibran seleciona uma frase do artigo citado:“O juiz federal Claudius Bonadio ordenou a prisão de vários Kirchneristas e pediu o impeachment de Cristina Fernandez de Kirchner. Além das profundas diferenças que temos com eles, rejeitamos essa manobra pelo governo Macri e seus juízes cúmplices.”e a tira completamente de contexto para demonstrar sua“verdade”. A ordem de prisão do juiz Bonadio aos kichneristas, era por suposta “traição à Pátria”,em relação aos acordos do governo argentino com seu par de Irã, referente às investigações pelo atentado à AMIA (Associação Mutual Israelita Argentina) ocorrida em 1994, que deixou mais de 80 mortos durante o governo Menem. Fica claro, nessa frase, que Esquerda Socialista rejeita uma condenação de tipo político. Mas, o artigo completo do jornal, é coerente com nossa posição de punir aos corruptos. No mesmo texto, nossos camaradas do Izquierda Socialista, colocam: “Essa rejeição às prisões ordenadas por Bonadio não deve se confundir com nenhum apoio político a estes personagens repudiáveis do kirchnerismo. Estivemos a favor de que De Vido(principal Ministro dos governos K) e Budou(vice-presidente de CFK)sejam presos por provadas causas de corrupção, e se alguns dos agora detentos se encontram comprometido em causas similares, não duvidaríamos em defender o mesmo”. Ou seja, nossos companheiros do IS, defenderam cadeia para os Kirchneristas envolvidos em corrupção. Nada mais desonesto do que dizer que devemos fazer uma “autocrítica”.
Mas o MAIS não para por aí. Em sua incansável cruzada em defesa de Lula, outro de seus dirigentes, Valério Arcary, fez uma proposta curiosa, para não dizer estapafúrdia. Numa pequena nota onde analisa a situação de Lula depois do julgamento em segunda instância, preocupado, Arcary lhe sugere à direção do PT: “O que farão Lula e o PT? Aceitarão o encarceramento de Lula? Uma possibilidade é a desobediência civil, o que significaria desacatar a ordem de prisão. Outro caminho, por exemplo, foi a decisão de Puigdemont na Catalunha de ir para Bruxelas. ” Inacreditável!
É inacreditável que Lula, um defensor da ordem e “apagador de incêndios” para salvar o regime, cogite a “desobediência civil”, nem a sua, nem da população, como muito bem caracteriza o historiador Lincoln Secco, um conhecedor do lulismo: “… o PT vai reagir com força verbal à sentença, mas será difícil no curto prazo mobilizar resistência nas ruas, porque os dirigentes atuais não comandam mobilizações há 20 anos e desconhecem sua base social”. Mas o curioso é a proposta de Lula fazer o mesmo que Puigdemont. Antes de tudo há que dizer que o dirigente catalão ia ser preso por desobediência civil, por uma luta política justa (a declaração da Independência) e não por corrupção como é o caso de Lula. O que surpreende é que Arcary recomende a covarde decisão de Puigdemont de fugir à Bélgica abandonando o povo que lutava contra a aplicação do articulo constitucional 155. Uma decisão errada, que fortaleceu o governo Rajoy e a monarquia causando tanta confusão como suas vacilações na hora de declarar a independência e enfrentar o governo central espanhol.
A relação entre a defesa de Lula e o projeto político para o próximo período
A esquerda brasileira precisa se afirmar como alternativa ao projeto Temer/PSDB e também ao lulopetismo construindo um terceiro campo, com um programa classista e de ruptura com a ordem. Ao se alinhar com qualquer um desses projetos burgueses atolados até o pescoço no lamaçal de corrupção, não poderemos criar uma alternativa que seja referência para milhões de trabalhadores que foram vítimas das políticas dos governos petistas e hoje são de Temer e da sua quadrilha instaurada nos ministérios e no congresso nacional.
Com uma política de defesa de Lula, acusado por atos de corrupção e comparecendo aos atos petistas, além de se desmoralizar, o PSOL fica atrelado a um projeto falido. O objetivo do PT, CUT, PCdoB e CTB é salvar Lula para chegar às eleições de 2018 e voltar a aplicar o mesmo projeto. Os objetivos da classe trabalhadora e das organizações políticas que dizem defender seus interesses devem ser outros, bem diferentes, lutar para derrotar Temer e suas contrarreformas, denunciando que a atual situação do país também é responsabilidade de Lula e do PT e nesse processo construir uma alternativa, um terceiro campo, independente da velha e da nova direita.
As mobilizações em defesa de Lula demonstraram que a população trabalhadora não está preocupada com a condenação de Lula. Isso se comprovou poucos dias depois, em pesquisa realizada pela Datafolha, onde mais da metade dos entrevistados 53% se manifestou pela prisão de Lula, enquanto 83% acreditam que Lula “sabia da corrupção”. Como identificamos em várias pesquisas, o sentimento generalizado é que a corrupção é um grave problema e que os responsáveis desse flagelo devem ser punidos, sem seletividade. Essa não é uma posição ultra esquerdista nem sectária como tratam de caricaraturizar algumas correntes, mas a justa vontade de milhões que se vêm burlados pelos políticos. Temos que nos preparar para responder a esse sentimento oferecendo uma alternativa de confronto com o Governo Temer e seus aliados, mas também com a direção lulopetista. Importantes setores de massa estão rompendo há anos com essa direção, mas ao não achar uma proposta clara e crível começa a se gerar uma dispersão perigosa. Só rompendo de vez com essa direção traidora e apresentando um programa que aponte uma saída de classe para o país, seremos enxergados como uma alternativa viável.
A construção de um terceiro campo, que realmente represente o projeto da classe trabalhadora, começa desde já pela luta contra a Reforma da Previdência e pela anulação da Reforma Trabalhista, da Lei das Terceirizações e da PEC do teto de gastos. Lula e o PT já anunciaram que não irão rever essas medidas aplicadas pelo corrupto governo Temer, por isso essa saída deve se construir sobre os escombros do lulismo, não sobre seus alicerces. Para fortalecer esse projeto, temos que propor um nome que encarne nossas propostas nas próximas eleições presidenciais. Por razões obvias esse nome não pode ser do campo lulista. De nossa parte propomos o companheiro Plínio de Arruda Sampaio Jr. A postura intransigente de Plínio ajuda a construir uma alternativa desde um terceiro campo, independente, de ruptura com o regime que está ai e com um programa capaz de superar o Programa democrático-popular e propostas de conciliação como o programa da Plataforma Vamos.
Uma saída diferente de tudo que está aí e que se propõe a romper com os pactos e acordos com o sistema financeiro, auditando e suspendendo o pagamento dívida pública para ter recursos para investir em saúde, educação, moradia e demais demandas sociais, anulando as contrarreformas e demais medidas contra os interesses dos trabalhadores aplicados pelos últimos governos tucanos, petistas e pemedebistas que atacam direitos trabalhistas, democráticos e de manifestação. Que visa impor a renacionalização das empresas privatizadas, uma Petrobrás 100% estatal e um plano de obras públicas capaz de gerar milhões de empregos dignos e melhores salários.
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Fonte: CORRENTE SOCIALISTA DOS TRABALHADORES/UIT-QI
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